segunda-feira, 16 de setembro de 2013

O direito de morrer velho - parte II

Em janeiro de 2009, produzi essa postagem:

Qualquer pessoa, em sã consciência, deseja viver muito. Morrer velho é a aspiração certa de todos.

Para isso, é preciso ter saúde, alimentar-se direito, zelar por si mesmo e ter sorte, ao final das contas.

Uma grande parte da responsabilidade de se alcançar este fim, evidentemente, é nossa; mas desde que saímos das cavernas e adotamos formas gregárias de viver, criamos mecanismos de proteção que vão além da mera auto-defesa. O Estado, ou qualquer outra forma de organização humana, é o encarregado de prover a proteção da vida daqueles que vivem sob suas leis ou regras. É assim desde tempos imemoriais.

Em nosso rincão, porém, esta obrigação não vem sendo cumprida. Morreu mais um ontem, que não chegou nem perto da terceira idade. Com 30 e poucos anos, o advogado Marcelo Castelo Branco Iúdice foi mais uma vítima da violência que assola o Estado.

Marcelo não era meu amigo. Era o que se convenciona chamar de “conhecido”, alguém com quem não se tem intimidade, mas cujo rosto é familiar pelos contatos frequentes. Cumprimentava-o sempre no fórum, em reuniões de classe, em restaurantes, em encontros de advogados. Era ainda muito jovem, e de aparência jovial. É mais um a quem o Estado negou o direito de morrer velho.

Ontem ele, anteontem um médico renomado de 54 anos, um pouco antes um sociólogo e blogueiro de pouco mais de 40. Tantos outros já foram vítimas, em bairros centrais ou periféricos. Nada disso abala a sonolência dos órgãos de Segurança Pública. Se antes a sensação era de insegurança, nas infelizes palavras de um ex-governador, hoje ela é de completo abandono. Vivemos o verdadeiro faroeste caboclo, sem apelo a ninguém e sem consolo – afinal, a morte não tem meio-termo, como dizia o poeta Cacaso.

Enquanto isso, em boa parte da capital, o ódio e o desalento da população alimentam novos criminosos, criados na forma de justiceiros. Retornamos ao tempo da auto-defesa, sob o olhar placidamente bovino da Administração Pública.

Cuidado, meus amigos. Previnam-se de todas as formas possíveis. A Grande Ceifadora tem brandido sua foice próxima a nossas cabeças, todos os dias, em todos os cantos. Estamos comprovadamente sós.

Só não podemos fomentar a sede de vingança privada. Somos humanos e, portanto, maiores que este conceito irracional. O Estado é quem deve cumprir sua parte. Cabe a nós chamá-lo à razão.

Lamento, por fim, iniciar o ano produzindo uma postagem destas. É mais um direito que o Estado nos nega: o da alegria.


Hoje, 4 anos e 8 meses depois, só mudaria o nome da vítima - de Marcelo Iúdice para Luigi Freire. A sensação de desalento e abandono é a mesma. Infelizmente.

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