domingo, 5 de outubro de 2014

Cesta do enfraseamento: Votos de cura a Serapião

Serapião confessou: -“Dotô, vendi meu voto”.
- Por quê? Retrucou o médico.
- O sinhô me pediu uma tomografia do pulmão, mas "num" dei conta, não.
- Mas eu preenchi tudo certinho e ainda pedi urgência pro seu caso!
-Por isso. Dotô, apesar de tudo certinho só ia ter vaga em janeiro. Até lá essa mancha que o sinhô diz que existe em mim faz um buraco no meu pulmão e viro procissão de vela. O senhor não conhece o SUS? Lembre que tô tussindo e botando sangue pela boca. Isso me deixa despombalecido. Não consigo trabalhar.
- Seu Serapião, o senhor vendeu pra quem?
- "Prum" Federal, por nome de Zé Cutia, que anda lá por Tracuateua. Ele ainda ganhou mais uns quantos da família e da vizinhança.
- então vamos lá, quede o exame? Respondeu o médico indignado.
-Tá aqui...
O médico desembrulhou, olhou a chapa por uns tempinhos e disse:
- Seu caso é de operação... O senhor tem uma ferida no superior do pulmão direito e enfisema no esquerdo. Eu já desconfiava na primeira chapa. Foi por conta daqueles porroncas.
-Fumava pra espantar os mosquitos e conseguir mergulhar no mangue para apanhar caranguejo. Depois “inda” tinha que esperar, pela madrugada, o barco passar pra dar destino aos paneiros abarrotados. Pium nenhum encosta quando a gente fuma. A fumaça espanta os bichos pelo cheiro.
Após um silêncio mórbido: -Mas dotô, vosmicê tem certeza?
-Absoluta. Respondeu compassadamente.
Após mais uma pausa: - Então vamos pra pedra, se é o que me resta!
- O senhor, seu Serapião, terá grandes chances de ficar curado, pois o tumor não está enraizado.
-Tumor? O senhor disse: tumor?
-Sim, sim. Foi isso!
-Mas "inda" agora era uma mancha, depois virou ferida, e agora é um tumor!!!
- Desculpe senhor, mas mancha, ferida, tumor são as mesmas coisas neste caso...
- Não sabia. Agora que dei de entender. Então é muito grave.
O médico baixou a cabeça, pegou a esferográfica, disfarçou e começou a pedir exames pré-operatórios para poder realizar a internação. Após alguns minutos escrevendo, Serapião interrompe novamente.
- Então, Dotô, valeu de vender meu voto... O caba ainda foi eleito. Deu “indagorinha” na rádio. Esse homem me salvou. Deus proteja ele lá por Brasília.

2 comentários:

Abel Sidney disse...

como não perdoarmos Serapião de vender o voto que lhe salvou a própria vida?!

mesmo que o Federal cause mortes a rodo, mais tarde, Serapião prosseguirá, esperançoso de formar os filhos e, quiçá, os netos. vá que um dos seus descendentes "dê certo" e se torne um político de respeito?!

não perdoaremos é o Roger, se ele espaçar demais os seus escritos... isso, não!

Geraldo Roger Normando Jr disse...

Caro Abel, seus comentários é que não podem escassear. Já começam fazer parte do próprio texto, embrulhados num pacote só.