quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Argentina: de volta ao passado

A Lei de Meios da Argentina nem bem começa a ser implantada e já está claramente ameaçada pelo governo do presidente Mauricio Macri. Basta dar uma passada de olhos nos protestos e cartazes, que dizem: na lei de meios não se toca.

Democratizar os meios de comunicação tem sido bandeira de luta em vários países, alguns deles com nítidos avanços neste sentido. Talvez a Argentina seja um dos mais recentes a comemorar o inicio da implantação da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual (Lei 26.522), ou simplesmente Lei de Meios, que tem sido amplamente debatida há mais de 20 anos. O cenário midiático no país azul e branco é muito parecido com o do Brasil, tanto no que se refere à concentração quanto às garantias de liberdade de expressão, para citar apenas dois elementos que compõem este cenário.  Aí está o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) que bem ilustra essa batalha.

A contextualização exposta aqui está a serviço de um momento crucial que vive a Argentina sob a égide de uma espécie de neomenemista, poderia-se comparar. Mauricio Macri tem provocado indignação de todos que fazem parte da rede de direitos humanos, que segue viva.

Dezenas de membros do coletivo Coalizão Para Uma Comunicação Democrática (CCD) estiveram reunidos na tarde de ontem (23) no auditório da Associação Argentina de Atores. Membros de sindicatos, cooperativas, organizações partidárias, movimentos sociais e profissionais liberais ligados à defesa da Lei de Meios e seus princípios afinavam a orquestra que sai às ruas no próximo dia 3. É quando se realizará o Congresso Nacional da CCD e se fará um ato público que culmine com a sensibilização de parlamentares, para que ajudem a garantir a aplicação da lei, ameaçada por decretos do novo presidente.

Aliás, em dois meses de governo, Macri já emitiu mais Decretos de Necessidade e Urgência (DNU) que sua antecessora, Cristina Kirchner, em dois mandatos presidenciais.

Durante a reunião, um assunto veio à tona e tem duas vias de observação. A via imediata diz respeito à liberdade cerceada para a cobertura de manifestações públicas, como a que ocorre no dia de hoje (24) em todo o país, quando os funcionários do Estado farão uma greve nacional. Um dos aspectos definidos pelo protocolo de segurança de Mauricio Macri informa que a imprensa ficará confinada em espaço previamente definido e gradeado até autorização da polícia, para que possa se misturar aos manifestantes. Além de poder ser compreendida como uma clara ameaça direta aos comunicadores, pode também ser analisada como um severo golpe à liberdade da atividade jornalística em si. Abro um parêntese para lembrar o valor que têm as fotografias de protestos durante a ditadura para que se chegue a informações queimadas em fornos, em memórias, em porões escabrosos das tripas humanas.

Membros da CCD tem se organizado em quase todo o país, para contribuir com um documento a ser defendido no próximo dia 3 de março, em Buenos Aires. Deixo aqui os 21 pontos, apenas em seus títulos:

1- A comunicação é um direito humano que inclui todos os suportes e plataformas
2- A regulação deve promover a diversidade e o pluralismo
3- Função ativa do Estado
4- Preservação e sustentabilidade do novo sistema de meios
5- Serviço e interesse público
6- Não discriminação e acesso universal
7- Autoridade com participação federal e social
8- Publicidade estatal com sentido inclusivo
9- Propriedade diversificada com pluralismo
10- Licenças locais e nacionais
11- Conteúdo nacional, próprio, local e independente
12- Privacidade dos dados
13- Neutralidade e interconexão transparente
14- O acesso à internet é um direito humano
15- Participação plural na governança das comunicações e internet
16- Acesso à informação publica
17- Soberania nas comunicações
18- Conteúdos de interesse relevante
19- Direitos do publico e dos usuários dos serviços audiovisuais e das TIC`s
20- Criação de emprego nacional digno
21- Regulamentação com plenos direitos

Sobre o cerceamento à liberdade de expressão na Argentina, o jornalista e professor Laurindo Leal Filho também escreveu e recomendo.