domingo, 5 de novembro de 2006

Mudanças na Academia

O Reitor da UFPa Alex Fiúza de Mello escreveu um interessante artigo no jornal Beira Rio, divulgado também na intranet da UFPa. Pela importância do tema abordado, o blog publica aqui para seus leitores.

Mudança de Mentalidade

Alex Fiúza de Mello

É mais fácil restaurar um museu, construir um prédio ou equipar um laboratório que mudar as atitudes de uma comunidade. É mais simples redigir normas, formular planos ou mesmo mudar o estatuto de uma instituição que garantir a sua atuação.
As reformas legais e de infra-estrutura são necessárias como sinalização de transformações materiais em curso na moldura da vida social; contudo, ainda que sintomas de mudança (produtos que são de ações coletivas), elas não garantem a priori e de per se a definitiva subversão de valores, a assimilação de novas práticas, a consagração de um outro padrão ou ethos cultural.
Não basta, assim, na arquitetura de uma Academia, a recuperação ou ampliação dos delineamentos mais visíveis e aparentes de suas condições físicas ou de seu ordenamento jurídico, ainda que a sensação do progresso material – daí a sua importância! – alimente a estética dos ideários e resgate a ciência da esperança. Imperativa é a perspectiva das mudanças moleculares mais profundas, aquelas que atingem os embriões das motivações, a genética dos compromissos, a engenharia das ações.
A Universidade é o Homem. É Ele a sua matéria-prima e a sua obra inacabada. Mas também o seu escultor. Nela, os verdadeiros monumentos são vivos. Os espaços e os prédios são apenas os contornos que podem favorecer ou prejudicar a realização da odisséia maior da conquista do saber. O professor, nessa viagem milenar, é o timoneiro; o artífice incansável da lapidação das incontáveis pedras brutas que, graças a toques de arte, aos poucos vão assumindo forma e conteúdo, até adquirirem sopro de vida própria – renovado o acervo da vida e a continuidade do processo civilizador.
A verdadeira reforma universitária, portanto, reside num esforço coletivo em favor de uma mudança profunda e radical de mentalidade no seio da própria comunidade acadêmica, na esteira da qual a responsabilidade primeira pela construção de um projeto de nação – que supõe a soberania exercida com base no domínio do Conhecimento (ensino e pesquisa de qualidade) – prevaleça, em gestos e atitudes, sobre a paralisia dos pessimistas, a omissão dos faltosos e o populismo dos oportunistas.
Há que se subverter os valores: daqui em diante, só poderão reclamar os que produzem; só poderão fazer greve os que de fato trabalham (estes ganham pouco!); só poderão cobrar aqueles que fazem primeiro o dever de casa e cumprem suas obrigações; só poderão pedir financiamento aqueles que apresentam idéias e soluções; só poderão comandar aqueles que souberem servir. A cátedra passará a ter prioridade sobre o palanque; a tese sobre o panfleto; o mérito sobre o privilégio; o argumento sobre o grito. Ficará resgatada, de uma vez por todas, a prevalência da Razão e da Tolerância; a do pluralismo das idéias sobre o pensamento único (de direita e de esquerda); a clarividência da responsabilidade e do dever da criatividade e da inovação sobre o obscurantismo do fanatismo e do imobilismo da mediocridade.
Estará re-fundada, então (somente então), a nova Universidade: mais competente, republicana e democrática. Uma Universidade efetivamente comprometida com o futuro da sociedade e não com o imediatismo dos interesses privados e corporativos dos pequenos grupos, dentro dela camuflados; a única capaz, para além das reformas de suas leis e de seu patrimônio físico (obviamente necessárias!), de cumprir adequadamente seus desígnios constitucionais e de garantir a imprescindível contemporaneidade de seus atributos e potencialidades no alvorecer de um novo século, engravidado de desafios e incertezas.

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