quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

E agora, Dom Cappio?

O Supremo Tribunal Federal, na manhã de hoje, negou o pedido de suspensão das obras de transposição do rio São Francisco, que lhe havia sido formulado pelo Procurador-Geral da República. Confirmando a negativa de liminar anterior, da lavra do ministro aposentado Sepúlveda Pertence, o plenário do Tribunal negou provimento a agravos regimentais interpostos pelo Ministério Público Federal e diversas ONGs de defesa do meio-ambiente. O mérito da ação ainda será julgado, sem data de previsão.

Com isso, em tese as obras poderão continuar, se o governo federal cassar outras decisões obstativas ao projeto e não ceder à pressão do bispo da Barra, na Bahia, D. Luiz Flávio Cappio, que há 23 dias está em greve de fome, protestando contra a transposição.

O assunto toma dimensões grotescas: a Justiça brasileira está sendo pressionada – chantageada, dir-se-ia mesmo – pela ameaça de suicídio do religioso; os movimentos sociais, políticos e artistas engrossam o coro do bispo; e agora, até mesmo sua ordem religiosa presta-lhe apoio, na forma de um telefonema que lhe foi dado pelo ministro geral da Ordem Franciscana, diretamente de Roma.

O governo federal, por sua vez, inicialmente relegou à própria Igreja o problema. Hoje, porém, governo e CNBB mantiveram reuniões, com a finalidade de superá-lo.

A história se repete: há alguns dias, no Pará, integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) protestaram contra o tratamento a eles dispensado pela Eletronorte invadindo a hidroelétrica de Tucuruí e recusaram-se a negociar com o governo enquanto não fosse concedida pela Justiça paraense ordem de habeas corpus ao líder do movimento, Roquevan Alves da Silva, que se encontrava preso em decorrência de abusos cometidos nos protestos. O habeas corpus, uma vez concedido liminarmente, tornou possível ao governo do Estado negociar a desocupação da barragem com o MAB.

O que se apresenta é um quadro de desrespeito às instituições e ao jogo democrático. E não me venham falar em Thoreau, Gandhi e desobediência civil: as condições do Brasil de hoje não são as mesmas da Índia dos anos 1940, nem o filósofo americano ou o político indiano pregavam a violência e a chantagem como formas válidas de combate político.


De mais a mais, a greve de fome de D. Cappio parece exatamente aquilo que é: muito barulho por nada. Afinal, as obras de integração do Velho Chico com as bacias do Nordeste Setentrional estão suspensas por outra ordem judicial, esta proferida pelo Tribunal Regional Federal da 1a Região.

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Atualizada em 20/12/2007, às 10:25hs: a greve de fome de D. Luiz Flávio Cappio terminou ontem, segundo noticiou a Agência Estado. Pelo menos isso.

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