domingo, 27 de março de 2011

Um Porto Alegre de emoções

Ei.
Vem comigo, passear aqui.

Sobre o Rio Grande do Sul. Torrão de meus ancestrais por parte paterna. Digo que meu avô , tenente do exército, embarcou no "Trem da Alegria" ao lado de Getúlio Vargas em direção ao Estado de São Paulo para dar início à revolução. Anos de 1930.

Ele é natural do Alegrete (RS). Terra de corajosos homens de armas na fronteira do Uruguai. Terra de homens de outras armas: a poesia.
Terra do maior líder político da história do Brasil: Getúlio Vargas.

Meu avô, Antonio Marcelino Pereira, foi um dos primeiros gaúchos a desbravar o até então inóspito sul do Pará, a partir de Conceição do Araguaia e, alguns anos depois, já casado, estabelecendo-se, até a sua morte, definitavamente em Marabá; onde serviu à comunidade, como delegado por mais de 10 anos.

Mas o que marca meu avô é outra coisa. Ele foi o primeiro industrial da região, montando fábrica de sabão, de mosaico, olaria; a primeira máquina de beneficamento de arroz importada da Itália, e como se não bastasse, introduzindo rebanhos de mulas e burros de cargas, prática pouco aproveitada pela população de então.

Meu avô foi um homem extraordinário.

E nas estâncias do gaúcho da fronteira. Guapos que fardam indumentária de botas cano longo com esporas, calça comprida bombacha, lenço ao pescoço e punhal na cinta incorporado no cinto com alforge que abriga o fumo, esmeradamente plantado, secado e cortado, para o caximbo ou papel de palha de milho para pitar.

O buraco cavado raso para espetar a carne da caça e vara fina, com brasa preparada com cavaco aparado e seco. Só o sal grosso no churrasco de fogo de chão. E a companheirada passando a cuia de chimarrão no sentido horário; a garrafa com água quente ou o bule aparado por corrente fixada em forma de triângulo, é o anteparo. E festa de confraternização, se dá.

Noutra fogueira o grão cozindo em fogo alto, lambendo o fundo do tacho de ferro. Arroz carreteiro e pimenta no pé da mesa.

O Alegrete é terra de Mario Quintana, o Alegrete é sua morada. Porto Alegre seu descanço outonal, num apartamento do Grande Hotel, falido, incorporado pelo governo do Rio Grande do Sul, onde hoje é a Casa de Cultura Mário Quintana, no Centro da cidade.
Conheci-a, por ocasião, na semana passada; em visita à prestigiar a abertura da agenda cultural da Casa de Cultura Mário Quintana, com exposição de fotografia na Galeria Xico Stockinger - Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul – espaço cultural trilegal –, onde minha irmã, a arquiteta e fotógrafa Flavya Mutran, abriu a pauta anual com a mostra individual "Pretérito Imperfeito de Territórios Móveis", um dos trabalhos premiados com o XI Prêmio Funarte de Fotografia Marc Ferrez de 2010, do Ministério da Cultura.

E vamos a Mario por ele mesmo.


Nasci em Alegrete, em 30 de julho de 1906. Creio que foi a principal coisa que me aconteceu. E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. Bem! Eu sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente. Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão. Ah! mas o que querem são detalhes, cruezas, fofocas... Aí vai! Estou com 78 anos, mas sem idade. Idades só há duas: ou se está vivo ou morto. Neste último caso é idade demais, pois foi-nos prometida a Eternidade.


Nasci no rigor do inverno, temperatura: 1 grau; e ainda por cima prematuramente, o que me deixava meio complexado, pois achava que não estava pronto. Até que um dia descobri que alguém tão completo como Winston Churchill nascera prematuro - o mesmo tendo acontecido a sir Isaac Newton! Excusez du peu... Prefiro citar a opinião dos outros sobre mim. Dizem que sou modesto. Pelo contrário, sou tão orgulhoso que acho que nunca escrevi algo à minha altura. Porque poesia é insatisfação, um anseio de auto-superação. Um poeta satisfeito não satisfaz. Dizem que sou tímido. Nada disso! sou é caladão, introspectivo. Não sei porque sujeitam os introvertidos a tratamentos. Só por não poderem ser chatos como os outros?

Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese. Outro elemento da poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das palavras. Talvez concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de farmácia durante cinco anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de Andrade, de Alberto de Oliveira, de Erico Verissimo - que bem sabem (ou souberam) o que é a luta amorosa com as palavras.

(Texto escrito pelo poeta para a revista IstoÉ de 14/11/1984)


Abduzido por ambiente impregnado do "fazer e circular" cultura; exercê-la plenamente sob as benções invisíveis do talento que sopra a emprenhar os desígnios de minha irmã; o pelejar agregado pelo esclarecimento acadêmico; o andar já da velocidade das redes sociais; um toque de gênio a apalpar os segredos da semiótica que nos rodeia, encanta e emociona a ponto de paixão desmedida, desmensurada. Foi isso que captei na rápida visita a Porto Alegre.

E cito Quintana:

Os degraus

Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...

(Baú de Espantos)


Meu relato em fotos.




































































































































Flavya Mutran e um casal de amigos. Ele, médico paraense radicado há 30 anos em Porto Alegre, ao lado de sua esposa, também paraense, de Belém do Pará.

Finalizando com Quintana.

PROJETO DE PREFÁCIO

Sábias agudezas... refinamentos...
- não!
Nada disso encontrarás aqui.
Um poema não é para te distraíres
como com essas imagens mutantes de caleidoscópios.
Um poema não é quando te deténs para apreciar um detalhe
Um poema não é também quando paras no fim,
porque um verdadeiro poema continua sempre...
Um poema que não te ajude a viver e não saiba preparar-te para a morte
não tem sentido: é um pobre chocalho de palavras.

Mario Quintana

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"Uhhhh Huuuu!!!!"

by Val-André.

5 comentários:

Paulo Santos  disse...

Quando vem para Belém???

tche disse...

excelente postagem!!!
saudades imensas das minhas terras!!!!
belém e porto alegre - como dói estar em exílio forçado em são paulo!!!

abraços e continuem com a qualidade dos posts!!!!

Val-André Mutran  disse...

Brevemente Paulo, mas não fui autorizado pela Flavynha a confirmar a data. Coisas de exigências de edital.
Você sabe como funciona.

Val-André Mutran  disse...

As duas cidades Tche, têm muitas características comuns.
Fiquei encantado com Porto Alegre, onde pretendo retornar com mais calma o quanto antes.

tadeu disse...

Bela postagem e confirmando os ultimos comentários difícil não se lembrar de Belém ao ver o por de sol no Guaíba.
Abs
Tadeu