Há poucas semanas adotei uma fotografia de meu avô, Scylla Lage da Silva, em meu perfil do blog, como uma espécie de homenagem ao misterioso link formado entre nomes, memória e poesia genética.
Hoje, sem motivo aparente e movido apenas por necessidade instintiva, troquei a foto por uma do meu pai, Scylla Lage da Silva Filho, mais próximo de mim pela convivência, pela carga genética e por densa amizade construída pelas curvas, subidas, retas e descidas do caminho.
Scyllinha, como o chamávamos, também era médico e gozava, como o seu pai, de enorme facilidade e rapidez na construção de poemas, especialmente de sonetos.
Ter o nome dele me ajudou muito na faculdade de medicina, na qual ele era coincidentemente coordenador de curso, nos tempos do Dr. Aracy Barretto.
Como resolvi divergir da sua especialidade, a proctologia, pude emprestar o seu nome de guerra, Scylla Lage, nos árduos e selvagens tempos da residência médica, em São Paulo.
Lá por 1989 aconteceu uma interessante mudança compulsória no meu nome.
Fui estudar em Homburg/Saar, na Alemanha, e o meu professor, já na primeira semana, escolheu o meu nome para o crachá: DA SILVA. Eu ainda tentei argumentar e mudar para LAGE ou LAGE NETO, sem sucesso.
Percebi então que eu mesmo tinha preconceito em relação a esta parte específica do meu sobrenome, da Silva, e que na minha auto-imagem residual eu não me imaginava como Scylla da Silva, um reles DA SELVA, um sem origem definida no velho continente, um ser gerado em bárbaro território tropical.
Após um breve período de repulsa, resolvi assumir a minha "da Silvidade" e passei até a curtir a sonoridade germânica do "DA SILLFA!!!".
Tempo depois, já morando em Freiburg, meu pai veio me visitar e a primeira coisa que o fez rir, assim que me encontrou no hospital, foi a gravata florida que eu usava, e a segunda, que o levou às gargalhadas, foi o meu crachá, onde se lia DR. DA SILVA, em letras bem grandes.
"Isso é o fim da picada!", disse ele. "Quem vai se deixar operar por um Dr. da Silva? No Brasil, ninguém!", concluiu.
Rimos muito juntos, e desde aquele dia ele passou a me chamar de DA SILVA em todas as ocasiões, até o fim da vida, o que acabou sendo copiado pelo meu irmão, pelo meu tio e por uns poucos amigos, até hoje.
Por conveniência abandonei o DA SILVA ao retornar à Belém, mas apenas no nome de guerra.
Me sinto, na verdade, mais DA SILVA do que nunca, e confesso que ao tomar emprestada a fotografia do meu grande amigo ausente, o meu pai, me senti estranhamente confortável.
Quem entende o que há num nome e o que há numa foto?
8 comentários:
Muito boa história, amigo. Eu e meus irmãos recebemos o "Augusto", para evitar sermos Filho, Neto, Sobrinho, sei lá. Nunca senti o peso de ter o nome do meu pai. Pelo contrário, maior orgulho.
abs
Obrigado, Edyr.
Um grande abraço.
Oi,tio DA SILVA!!!Adorei sua história!!Bjs
Da Silva, esses alemães acharam que "Scylla" soava como adversário e tivesse um cordão hereditário com judeus, não? Eu, particularmente, achei estranho o "Da Silva", como me é estranho o Geraldo, mas o que importa é que o roteiro tomado pela sua narrativa torna a história intrigante e nos suscita comentários.
Mundo das Dolls, obrigado.
Você é a primeira pessoa a me chamar de Tio da Silva!
Beijos.
Roger, obrigado pelo comentário. Alguém chama você de Geraldo, tipo um parente ou colega de escola?
Bela historia syllinha, pra mim sra sempre assim, sou a suely que trabalhava com o Bisi e Tatá, mas eu adorava dr Scylla sempre bonachao, lendo a cronica, lembrei de meu amigo cumpadre do Jr do Sao Marcos, quando sai, vc nem formado era. abração da Silva,
Puxa, Suely, que bom ler você por aqui!
Bons tempos aqueles do São Marcos, não é mesmo?!
O Júnior era o centro do centro cirúrgico!!!
Nunca mais o vi.
Você era uma espécie de ídolo de todos os acadêmicos mais novos, pois operava e muito bem.
A última notícia sua que tive foi que você estava no Acre, mas faz MUITO tempo.
Mantenha contato, por favor.
Um grande abraço!
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