sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

O bom. O mau. E o feio?

Não, nem todo rico é mau e nem todo pobre é bom. E vice-versa. Creio nisto, com todos os reducionismos ou desmembramentos conceituais que os termos podem nos remeter. E não faltam exemplos no nosso cotidiano que põem em xeque esta pseudo-dicotomia. Talvez por isso, viver numa sociedade que ainda estabelece muitas de suas regras a partir do que julgo ser “vazio” de sentido seja tão desconfortável.

Doeu encontrar como pedinte uma senhora que conheci pobre, mas que agora se encontra muito mais empobrecida e humilhada. Choramos juntas. Foi inevitável. Mas seguimos para fazer o que era possível e necessário naquele instante. O assistencialismo. Ela saciou, no jantar, a fome do café da manhã. E levou para o casebre sacolas plásticas de felicidade para os filhos. Levou para casa também mais uma das punições do mundo: o segurança do supermercado tentou impedir Dona Francisca de entrar no recinto. Calada ouviu. Calada permaneceu a me olhar. A uma explicação da distinta jornalista de que aquela senhora estava comigo, o segurança abriu a guarda. Não valia a pena culpa-lo naquele momento. Nos resignamos e seguimos para as migalhas do dia e traçamos planos que, aos poucos, se realizam. E como são poucos, para esta senhora que pariu onze filhos, foi abandonada pelo marido e enfrenta todas as mazelas de uma saúde condizente a dos miseráveis.

Não somos bons. Nem somos maus. Prefiro pensar, talvez, no que é feio. Feio é não nos sensibilizarmos diante da dor alheia. Feio é não fazer algo pra mudar o que for possível e um pouco mais. A dor não passou.

Feliz Natal, Dona Francisca!

4 comentários:

Carlos Barretto  disse...

Texto antológico.
Lindo!

Yúdice Andrade disse...

O tempo passa e não consigo superar um problema de origem: não gosto do Natal. Não que algo nele me incomode. É que nessa época fico muito mais incomodado com o sofrimento de pessoas como a senhora retratada na postagem e com o de outros, que se encontram em condição pior ainda. Já fui voluntário no setor de câncer oncológico do Ophir Loyola e passei quatro natais por lá. Era doloroso demais.
Em suma, o Natal me maltrata, por mais que eu veja nele uma oportunidade para o mundo. Gostaria que mais pessoas agarrassem essa oportunidade. Feliz Natal para todos.

Erika Morhy disse...

Obrigada, Carlos. Mas, talvez, meu pai, que sempre assistiu muitos filmes de "faroeste" com meu irmão, talvez ele dissesse que, antológico mesmo, só o filme [rs]. Eu mesma nunca gostei, dos filmes.

Erika Morhy disse...

Yudice, acho que, uma vez tocados pela dor alheia, é difícil ter volta. É difícil voltar a ser (se é que já se foi) apenas leve, cheio de esperanças... Parece que somos brindados com um desafio que sserá eterno. Então, vamos ele, não é?