As organizações que defendem o fim da pena de morte pelo mundo comemoraram o fato. No entanto, 37 dos 50 Estados Unidos ainda mantêm a prática.
A pena de morte é um resquício no mundo ocidental moderno da Lex Talionis, expressa no brocardo dente por dente, olho por olho. No Estado brasileiro, a proibição de instituição de pena de morte é cláusula pétrea da Constituição Federal, excepcionada apenas nos casos de guerra declarada.
O movimento mundial de proteção aos direitos humanos ainda não conseguiu incluir a renúncia absoluta à pena de morte em seus documentos. A própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, apesar de prever o direito irrestrito à vida, à segurança e à liberdade e de repudiar a aplicação de castigos cruéis, desumanos ou degradantes, não negou expressamente a possibilidade de os Estados signatários (dentre eles, os EUA) adotarem a pena de morte. Posteriormente, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966, ratificado pelo Brasil por meio do Decreto presidencial n. 592/92, assinado por Fernando Collor, fez menção expressa à pena de morte, permitindo-a “nos casos de crimes mais graves, em conformidade com legislação vigente na época em que o crime foi cometido e que não esteja em conflito com as disposições do presente pacto, nem com a Convenção sobre a Prevenção e a Punição do Crime de Genocídio”, observada a devida sentença transitada em julgado, proferida por juízo competente.
No entanto, para mim é claro que caminhamos para a abolição completa da pena de morte. Apesar de boa parte da população ainda acreditar na relação de causa e efeito entre a pena capital e a diminuição da criminalidade, nenhuma estatística é conclusiva sobre o caso. Ao contrário: nos EUA, já foi várias vezes demonstrado que a eliminação dos criminosos não tem o poder pedagógico que os defensores da pena de morte acreditam que ela tenha.
A manutenção da pena de morte em países que se dizem avançados é a clara continuidade de uma prática superada, para dizer o mínimo. É insidioso assumir a defesa da morte do criminoso como meio de evitar crimes hediondos; é selvageria querer que o Estado vingue a sociedade, em lugar de punir e, com a punição, ressocializar o autor de um crime.
A propósito, o clown midiático Diego Mainardi defendeu a pena de morte em sua coluna da Veja desta semana. Assim Mainardi inicia sua defesa do assassinato estatal:
Pena de morte. É um tema perfeito para o período de Natal. Enquanto as pessoas confraternizam com parentes e amigos, distribuindo presentes e bons sentimentos, eu confraternizo com a cadeira elétrica e a forca.
A pena de morte reduz consideravelmente o número de assassinatos. Para cada criminoso condenado à morte, ocorrem de três a dezoito assassinatos a menos. A estatística consta de uma reportagem do New York Times, de onde chupei os dados publicados nesta coluna.
A reportagem do NYT, a que Mainardi se refere, relata uma controvérsia que retomou fôlego, nos Estados Unidos, entre scholars de Direito e Economia, contrapondo visões que vão desde a diminuição da criminalidade em decorrência do efeito persuasivo da pena de morte à importância de se custear a máquina administrativa da morte, em detrimento de outros investimentos em questões mais importantes.
O artigo do NY Times efetivamente faz menção à estatística mencionada por Mainardi, mas não chega à conclusão efusiva do colunista de Veja. Pelo contrário: propõe mais dúvidas que certezas.
Reafirmo, de minha parte: é um absurdo, nos dias de hoje, creditarmos à pena de morte a possibilidade de diminuição de crimes, notadamente dos mais graves, como homicídio, latrocínio (roubo seguido de morte), delitos de conotação sexual (atentado violento ao pudor, estupro) ou seqüestro, entre outros. A evolução do conceito de direitos humanos não permite a vendeta como punição penal – além da impossibilidade de correção, ou indenização, da vítima de erro judicial, quando lhe for cominada e cumprida a pena capital.
2 comentários:
Também publiquei algo a respeito, Francisco. Nossas linhas de pensamento são as mesmas.
Acrescento que Mainardi é uma anta. Impressiona-me como tanta gente neste país se ajoelha ao que se sujeito escreve. Ah, sim, a raiva que muitos têm do Lula colocaram esse moço numa condição de porta-voz. Mas a leitura tosca, primária que faz da matéria no NYT mostra o seu nível. As estatísticas mundiais mostram o contrário. Duvido que o NYT dissesse uma asnice dessas.
Mas a anta disse.
Yúdice, li seu post a respeito do assunto.
Realmente, Mainardi é uma anta. Reinaldo Azevedo e Olavo de Carvalho, outros críticos mordazes (e grosseiros) de Lula e do petismo, têm, ao menos, estofo intelectual - apesar de padecer da mesma raiva que às vezes lhes embota o pensamento.
Mainardi, no entanto, é só isso mesmo: uma anta com hidrofobia.
Abs.
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