sexta-feira, 6 de junho de 2008

Especulando sobre a especulação

Semanas atrás, o diretor da Agência Nacional do Petróleo, Haroldo Lima, causou um rebuliço no mercado de ações ao anunciar, em um seminário sobre petróleo e gás natural, que a Petrobras teria descoberto o terceiro maior campo petrolífero do mundo, na Bacia de Santos. Para se ter uma idéia de sua dimensão, o campo de Tupi, cuja descoberta foi anunciada final do ano passado pela estatal, possui uma reserva estimada em 5 a 8 bilhões de barris; o campo aludido pelo diretor da ANP possuiria, segundo previsões não oficiais, cerca de 33 bilhões de barris.

Posteriormente, Lima teve que explicar que o anúncio não era oficial, porque nem confirmada havia sido a descoberta. Entretanto, o estrago já estava feito: na Bolsa de Valores de São Paulo, as ações da companhia, que estavam em queda na oportunidade, deram um salto de valorização de 4% em um único pregão.

A desastrosa (ou esplendorosa, dependendo do ponto de vista) declaração de Lima não passou em branco. A Procuradoria Regional da República no Rio de Janeiro, logo após o anúncio e seu quase-desmentido, instaurou procedimento administrativo para apurar a ilegalidade do ato mal pensado. Afinal, a afirmação, partindo de quem partiu, geraria evidente especulação financeira em torno do fato, influenciando a ação natural do mercado de valores mobiliários. Além disso, a conduta poderia ser enquadrada em mais de um tipo penal previsto pela Lei n. 7.492/86, que define os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional.

A lembrança me veio a propósito da nota Mercado, do Repórter 70 de O Liberal de hoje. Em lance que se assemelha a um recado, traça a coluna o seguinte diagnóstico:

O mercado imobiliário está de olho na valorização dos bairros de Val-de-Cães, Marambaia e Bengui, às proximidades do Mangueirão, onde serão executadas obras de corredores de transportes visando ao Fórum Mundial, em 2009, e à Copa de 2014. Com a criação de novas avenidas, essas áreas terão valorização imediata e quem largar na frente leva vantagem. Os preços de terrenos nessas áreas já começam a ganhar corpo.

O anúncio sobre os corredores de tráfego ainda não foram divulgados pela prefeitura ou pelo governo estadual. Tudo o que existe ainda é especulação. Evidentemente, existem estudos em estado avançado sobre as novas vias de transporte a serem oferecidas à cidade; a busca por recursos, inclusive, já começou há algum tempo. Porém, vários outros elementos da equação ainda estão em aberto, não permitindo confirmação sobre a realização de obras.

Por isso, a nota tem o desenho de um anúncio especulativo, tendente a privilegiar certos atores desta cena. A área em volta do estádio Mangueirão tem contornos ambientais que precisam ser considerados: há grande área de mata nativa e o igarapé São Jorge a divide; mas boa parte dos terrenos, da Rodovia Augusto Montenegro à Avenida Júlio César, tem proprietários conhecidos – na maioria, grandes construtoras que ali edificaram, na última década, condomínios horizontais de luxo.

A região, ainda, é profusa de invasões. Este cenário é o alimento típico da sanha especulativa que precede grandes obras de infra-estrutura ou, até mesmo, o boom imobiliário de determinados bairros, empurrando seus habitantes originais para a periferia das grandes cidades. Em nossa capital, como exemplo, basta lembrar de como era o antes aprazível bairro do Umarizal, uns quinze anos atrás.

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