quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Xenofobia à italiana

Não surpreende a acusação do premier italiano, o bufão Silvio Berlusconi, de que a esquerda do país estaria pretendendo fomentar uma "invasão estrangeira" na Itália. É ele craque em tais declarações.

À parte a justificativa de que o muxoxo se refere aos imigrantes ilegais, há evidentes sintomas de que a direita italiana, na verdade, mantém vivo o fantasma da xenofobia, que também tem lugar cativo na República Francesa e em outros países europeus.

Cabe lembrar, porém, que dois fenômenos históricos tornam premente que esta Europa olhe para sua imagem no espelho.

O primeiro diz respeito às colônias europeias que, desde o Império Romano, se multiplicaram mundo afora. França, Inglaterra, Itália, Bélgica, Espanha, Portugal, Alemanha, em diferentes épocas e sob diversas formas e justificativas, invadiram muitos países do chamado 3o Mundo (e até alguns que se alinham a eles entre as nações desenvolvidas), na América e na África, sem serem obviamente convidadas.

O segundo refere-se ao movimento contrário: imigrantes italianos, fugidos das Grandes Guerras, povoaram vários países cujos emigrantes hoje rejeitam. Em todos eles (Brasil, Estados Unidos e Argentina, por exemplo) foram muito bem recebidos.

16 comentários:

Nilson Soares disse...

A história e suas ironias, como já muito bem observado em comentários anteriores, num país em que milhões de pessoa emigraram por medo do fascismo e da violência dos aliados na II Guerra.

Por outro lado, tirando o fato de que a itália tem um chefe político de métodos duvidosos (para dizer o mínimo), a questão da conveniência dos imigrantes não é somente ética é também um juízo de viabilidade econômica do administrador público.

Sem falso moralismo, certas características concretas podem realmente justificar a restrição (não proibição!): pobreza; desqualificação profissional; e etc.

abs,

NIlson

Anônimo disse...

Que o diga , Karl Heinrich Schümann , não por acaso meu avó , que se instalou em Belém em 1904 e junto com alguns amigos adeptos do esporte fundou o glorioso Clube do Remo,que pra nossa felicidade virou de futebol também.
Abs
Tadeu

Francisco Rocha Junior disse...

Nilson,

Restrição, como você bem fez notar, não é sinônimo de proibição. Muito menos se pode falar em "invasão estrangeira" sem denotar certo racismo, eu diria.

O componente econômico, obviamente, é um argumento válido, mas para gerar regras de imigração legal. Rechaçar estrangeiros como se fossem inimigos, só por não serem italianos, é obviamente condenável.

Obrigado por sua leitura e comentário.

Francisco Rocha Junior disse...

Grande Tadeu,
Não sabia desse tua história familiar. Me deu até inveja, agora!
Abração.

Itajaí disse...

A xenofobia faz parte da história da Europa. Agudiza-se em tempos de crise política e econômica, habilmente instrumentalizada pela extrema-direita, sempre disponível nessas horas.
São como cães de guarda ferozes. E nada como o decadentismo do estado italiano, legado cultural quase insuperável primeiro da aristocracia pós-unificação, e depois, da burguesia industrial que, derrotada na II Guerra em seguida emerge do estado fascista de Mussolini, para dar comida a eles.
Não de pode entender a Itália de hoje se não fizermos esse nexo causal. Isto explica Togliatti, Aldo Moro, Brigadas Vermelhas, os escândalo do Banco Ambrosiano, o italiano ex-brigadista que ainda está preso aqui, o canastrão do Berlusconi, a falência da social-democracia e do Partido Comunista Italiano, a notória subserviência a OTAN e aos EUA. A Itália é desafio no século XXI.

Carlos Barretto  disse...

Isso é tipicamente coisa da direita mesmo. Que aliás, adora disseminar a falsa informação aos desavisados, de que não existiriam mais "direita nem esquerda". Papo que só interessa a quem? E em que momento. Contudo, uma variante de xenofobia, amplamente estimulada pela direita paulistana, é a odiosa raiva dos nordestinos. Que vêm a ser todos os demais, de baixo para cima no nosso mapa. Ahh! A direita e seu cacoete de excluir.

Nilson Soares disse...

Prezado Itajaí, permita-me acrescentar ainda o ítalo-sardenho Antonio Gramsci. Mil berlusconis não dão conta nem da metade da idoneidade moral desse pensador que preferiu agonizar no cárcere a renunciar ao seu próprio diagnóstico das relações de poder. Numa época em que existiam homens dipostos a morrer pelo que lutavam, e não mais hoje, preocupados em manter-se no mundo do consumo...

Scylla Lage Neto disse...

Francisco, sua postagem é muito interessante pois abre o pensamento e a discussão para esse tema tão polêmico quanto presente.
Ao norte da Itália os italianos de cabelo castanho e pele "escura" são vítimas da mesma xenofobia que aplicam aos que estão abaixo de suas latitudes.
Quando a sensação profunda de repulsa vence a barreira subliminar e vira leis, decretos, ordens, ao meu ver institucionaliza uma banda podre dos humanos.
Quanto ao Brasil, concordo com o Barreto: acima do território do Trópico de Capricórnio somos todos "os outros".
E adiciono ao pensamento do Itajaí a idéia de que a xenofobia faz parte não só da história da Europa e sim da própria humanidade.
Um abraço.

Francisco Rocha Junior disse...

Itajaí, caro,
Estamos plenamente de acordo. Ressalvado o Battisti, como já se discutiu muito por aqui.

Francisco Rocha Junior disse...

Bem lembrado, Carlinhos. O Reinaldo Azevedo, de triste notoriedade, já expressou esse racismo explicitamente em seu blog.

Francisco Rocha Junior disse...

Scylla,
Entendo que a xenofobia sempre faz parte de uma cultura que despreza o multiculturalismo, a soberania e a autodeterminação dos povos. Por serem conceitos modernos, pode-se admitir sua inobservância em outras épocas - admitir, não aceitar. Mas hoje em dia, não ha como relativizar.

Francisco Rocha Junior disse...

Scylla, outra coisa: creio que a posição xenófoba, na Itália, seja do norte rico e industrializado, em relação ao sul, pobre e rural, não?

Francisco Rocha Junior disse...

Desculpa, Scylla. Interpretei mal teu texto. Agora que caiu a ficha.

Itajaí disse...

E vejam como são as coisas: Os trabalhadores das cidades industrializadas do norte foram aguerridos na resistência ao fascismo e a ocupação alemã. Chegaram por meio de greve a melar a transferência da fábrica da Fiat para a Alemanha!
Quanto ao Batistti, Francisco, ainda quero te ouvir pessoalmente.

Itajaí disse...

Isso aí, Nilson. Antes falavam mais do Gramsci, agora me parece nem na universidade. Brasileira, é claro.

Nilson Soares disse...

Itajai, falar para quê? não dizem que o livre mercado e a democracia representativa formal é o suficiente para realização de uma sociedade? Veja o Brasil que maravilha!