segunda-feira, 9 de março de 2015

Que soprem novos ventos



Tudo bem que o tiro pode sair pela culatra inesperadamente. Qualquer um está sujeito. Nem todas as nossas previsões e decisões alcançam o que almejamos. Mas, vamos combinar: algumas delas são brutalmente tomadas sem a perspectiva mínima de justiça e bem comum. E fui absorvida por esta sensação quando a presidente argentina, Cristina Kirchner, anunciou a largada do processo de reestatização da malha ferroviária destroçada pelos lobos capitalistas.

O país tinha uma das redes mais extensas do continente, preservava a natureza tanto quanto beneficiava a população com empregos, transporte de cargas e passageiros, formação de mão-de-obra local e conhecimento. Ia de vento em popa. Mas no meio do caminho havia uma pedra. E que pedra! A privatização que se disseminava na Argentina como em muitos outros países, o Brasil inclusive, chegou na rede ferroviária de maneira estúpida.

Patrícios é apenas uma das cidades fantasmas que restaram. Onde viviam 6 mil pessoas restaram 600. Com o último trem, foram fechadas 800 estações e 400 mil famílias (mais de um milhão de pessoas) foram obrigadas a migrar. Lares desfeitos, produções passaram a ter de escoar pelas trilhas rodoviárias. Desemprego devastador. Um docinho para quem adivinhar os beneficiários. Alguém?

O Brasil tem muito a revelar de sua história ainda. E eu a conhecer. E a me surpreender, por suposto. Juscelino Kubschek não se arvorou a uma Belém-Brasília impunemente. Tampouco a população estava preparada para esta vocação imposta e impostora.

Eu realmente espero que os planos da presidente argentina dêem certo. Que os opositores saibam qualificar seus discursos, ao invés de cavar as situações mais tolas para criticar o governo. Espero que o Brasil possa buscar rumos menos inóspitos. E deixo o convite para que assistam este documentário do agora senador Pino Solanas, produzido em 2008. É um monte de sonho, mas eu arrisco.

Que soprem novos ventos!

2 comentários:

Marise Rocha Morbach disse...

Muito curiosa a guinada para o retorno às ferrovias, eu acompanhei a Belém-Brasília e tenho coisas muito boas sobre ela. O seu texto revela bem o que significa uma guinada brusca de opções de investimentos em transporte, principalmente para toda a cadeia econômica que está no seu entorno. Aqui tivemos a péssima ideia dos militares das estradas, os resultados estão ai. E quando optaram pela estrada de ferro é essa aí da Vale. Beijos querida e continue nos contando coisas dos nossos hermanos.

Erika Morhy disse...

Sim, é curiosa, Marise. Por outro lado, coincide com a ânsia do governo de retomar os trilhos da estatização. Fez isso recentemente com a petroleira, a YPF, por exemplo, que já 51% estatal. E a decisão melhorou muito a imagem da presidenta, segundo pesquisas de opinião.
O documentário me impressionou. Os relatos a as imagens dos caminhos abandonados, a voracidade dos privatistas e empresas.
Este é um ano de eleições por aqui e muitas águas ainda vão rolar. Vou tentar contar o que der conta, querida. Obrigada pela sua leitura e sinta-se muito a vontade para nos contar seus contos. Eles são muito bem-vindos!
Abraço bem grande.