domingo, 5 de abril de 2015

Cesta de enfraseamento: A jovem America Latina...



“Aumenta o número de mortos em San Salvador”. Era somente essa notícia que se ouvia no nanico rádio do barco de imigrantes, até que um pedaço de pedra o atingiu.

- Já estava falhando - disse um passageiro virando-se para trás procurando sua família.                                            

Outro tripulante levantou-se e seguiu em linha reta na direção da cabine do piloto. Cambaleou na direção contrária do balanço do barco e conseguiu alcançar a porta semi-aberta da cabine.

- Quanto tempo ainda falta? - Perguntou o velho de chapéu de palha rasgado na lateral.

- Não sei, meu senhor. Não é pouco tempo - respondeu friamente o piloto.

O barco era hondurenho, e navegava pela costa atlântica de Honduras. Foram dias e dias, semanas e semanas de exaustão dos passageiros salvadorenhos. Suas casas rodeadas por soldados lhe pareciam mais confortável que aquele barco emprestado. Não tinham roupa suficiente para todos os dias, por isso, ou vestiam as usadas ou trocavam com outros passageiros.

Foram se aproximando da costa brasileira e já podiam enxergar a terra, mas não distingui-la plenamente...(*)

O texto acima é parte de uma obra fictícia e totalmente desconhecida da mídia que retrata a guerra civil de El Salvador (1980-1992), porém traduz claramente o thriller da America que vive seus desvarios desde quando o espanhol marcou com suas botas as areias do Caribe.

Quem vai à Espanha e visita Barcelona, às margens do Mediterrâneo, vê, no final da Ramblas, a estátua de Cristovão Colombo apontando para determinado destino. Se consultarem o GPS, ou mesmo a velha bússola, perceberão que aquele dedo aponta para o “Novo Mundo”, a América. “Mas ninguém suspeitava que o mundo seria, logo, assombrosamente acrescido por uma vasta terra nova”, recitou Eduardo Galeano em sua obra “As veias abertas da América Latina”.

Ao se lançar à travessia desse grande vazio geográfico para transformar sonho em realidade, Colombo e suas naus enfrentariam tempestades terríveis que arremessariam aquele mundo na bocarra do capitalismo selvagem europeu.

De fato, a boiúna dos mares tenebrosos, à espreita de sua próxima vítima, estava ávida por carne humana, e a América deixava suas veias abertas e o fígado exposto ao europeu sedento e faminto.

Depois vieram os navegantes portugueses ao assegurarem que os ventos ao sul do equador traziam além de muita terra e pau-brasil, matéria-prima e pedras preciosas para a sobrevivência e luxo da coroa. Surrupiaram a terra sem deixar qualquer legado político.

Na América do Norte, no entanto, a maturidade política os libertou muito cedo das amarras inglesas, e começaram a ditar nova ordem na América latina, que apesar de ter certidão registrada em cartório, nome e passión, não tinha alma e epiderme.

A América latina cresceu feito rabo de cavalo, para baixo, explodindo em guerras civis, expandindo o narcotráfico e a corruptela política. Seguimos sem olhar para o próprio rabo e colocando culpa no fantasma do imperialismo do tio Sam. Já se passaram 500 e ainda nos faltam, com poucas excessões, uma carrada de cem anos para que alcancemos a maturidade política e abandonemos essa Macondo solitária de todos os fãs de Gabo.

E eis que quando definitivamente nos libertaríamos da última guerra civil, a de El Salvador, e do embargo a Cuba, nasce, a fórceps, a ideologia - “dizque” - bolivariana, para atolar definitivamente o galope latino.

Se à Venezuela já falta papel higiênico nos supermercados para limpar as beiradas, como estará o centro intelectual desse país, em plena crise? Já Cuba lança-se ao encontro do gigante, e passa a chave da prisão a Simon Bolívar exumado, que se afoga na solidão da ditadura latina. 
(*)"Victor Rivera", de João Pedro Normando, 2011 (produção independente).

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