sábado, 11 de abril de 2015

Cesta do enfraseamento: "Terapia", com Abel Sidney

Poema exige, assim, ritual de deglutição lento e sem pressa, 
para que após o prazer da mastigação permaneça
algum sustento para a jornada
Abel Sidney, poeta.


Hoje Labareda faz um voo curto em seu enfraseamento e se aninha na poesia de Abel Sidney. Aconselho a lê-la como se tivesse bebendo caldo de cana tirado direto da moagem e depois sair pelas soleiras ouvindo Vinicius de Moraes num fone de ouvido estereofônico usando óculos escuros, fingindo ser rapper e sem pressa de chegar.
 


TERAPIA

A poesia, veículo e recipiente,
púlpito, espelho, travesseiro
serve para isso: terapia.

Não, não é analgésico!

Não suprime sintomas, efeitos.

É mais um buril que lavra,
insculpe, lapida, desbasta.

Nosso rosto fica mais nítido,
pois os arranjos das palavras
criam fundo, suporte, cenário
para o ato sagrado e solitário
de nos desvendarmos...

Lemos poemas alheios apenas para
criarmos nossos próprios unguentos!

Aprendemos a versejar
para que as palavras,
com o seu poder,
ganhem leveza,
força e graça.

Assim, vamos falando dos nós
a destravar dentro de nós...

Falamos da dor da timidez
que não nos deixa cometer
deslizes, atos de insensatez
para que a vergonha não
nos torture e mate...

Falamos do medo de errar,
mesmo de tentar buscar
novos rumos, por não
desejarmos nos revelar
frágeis como somos.

Falamos dos receios de
encontrar o grande amor
e ter que se arriscar a sair
para a grande aventura de
nos agasalhar um ao outro...

Falamos para nos vermos,
para nos ouvirmos, para sermos
instante e infinito.

2 comentários:

MADMARIA-2011 disse...

Bastante profundo....queria ter coragem para fazer poesia das minhas dores, dos meus desesperos, das minhas mágoas, dos fins de todos os amores que tive....mas nao tenho coragem de dar à luz esses fantasmas que me consomem...nao sei fazer poesia!

Geraldo Roger Normando Jr disse...

MADMARIA-2011, eu também concordo com você. Só o Abel é capaz de nos dizer, com toda essa verve literária, o quanto precisamos desses agentes codificadores da poesia. Ele é fantástico, mesmo. Desde menininho, pelas ruas de Ji-Paraná, brincava com as palavras e ainda defendia pênaltis.