quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

De tanto falar à ousadia de não silenciar

Apresentar um livro sobre segurança pública, justiça e direitos humanos na Amazônia é uma ousadia. Não pelo tema em si. Afinal, falamos dele todos os dias, usamos diferentes ferramentas para discutir sobre ele, sentimos na pele a presença dele. Mas é por isso mesmo que o tema é ousado. A naturalização da violência é vil demais para cruzamos os braços e calarmos a boca, num esforço de avançar para uma transformação digna em sociedades que se crêem avançadas em tantos setores - sim, calar pode ser o mesmo que repetir exaustivamente, por isso empreguei aqui a palavra, que de pronto é antítese do falar.

Pessoalmente, poderia definir assim, como ousada, a iniciativa da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), que apresenta pela segunda vez uma obra com esse perfil e definida no formato de caderno.

Abro um parêntese para o termo caderno. Ele pode ser vulgarmente compreendido como uma compilação de folhas a serem lidas e obedecidas, após milimetricamente copiadas numa clássica sala de aula. Eu prefiro acreditar que a obra foi batizada assim por sua livre construção, e construção de uma obra que instiga a expansão das idéias, não sua mera reprodução ou relatoria. E digo isso porque a organização desta obra, sob batuta da advogada Anna Lins, coordenadora do Programa Acesso à Justiça (PAJ) mantido pela entidade, foi feita de forma coletiva. Contou com a colaboração de diferentes segmentos sociais, movimentos populares, instituições de diferentes matizes e pessoas com diversos níveis de inserção política e compreensão dos assuntos que atravessam a questão da violência e da justiça no Pará e na região. Um método louvável, trabalhoso e principalmente responsável diante de tamanho desafio que é vencer a crueldade das violações que nos assustam a cada dia.

Em artigos coletivos ou individuais, o caderno “Segurança pública e justiça: direitos humanos na Amazônia” revela o compromisso de todos e cada um, aliados a uma entidade que se mantém e se renova há 38 anos na região. Aborda desde a criminalização de movimentos sociais a conflitos fundiários; do controle social frente à segurança pública ao papel da Ouvidoria do Sistema de Segurança Pública no Pará; da polêmica redução da maioridade penal ao genocídio da juventude negra; do controle da letalidade policial à tortura; do lugar da mídia nesse contexto às audiências de custódia; da desmilitarização da segurança pública ao atendimento a vítimas de violência no Pará. Dentre outros temas, também está a reflexão sobre grupos de extermínio e milícias no Estado, pauta que já rendeu a formação de uma comissão parlamentar de inquérito e a entrega do respectivo relatório ao governador do Pará. Pauta que ontem mesmo acrescentou um dedo de prosa nesta história.

Pulsante, a discussão sobre intolerância religiosa, ataques a terreiros e suas lideranças é assinada por Arthur Leandro. Ele abordará o mesmo tema na sede do Instituto Nangetu, durante a apresentação do livro ao público, amanhã (08), às 19h. A obra foi lançada no último dia 09 de dezembro e está à venda por R$30.

É meu convite aos leitores do Flanar. Vamos?

| P.S: Atualizado para revisão dos temas abordados no livro.

2 comentários:

Geraldo Roger Normando Jr disse...

Querida Érica, infelizmente estou fora de Belém por compromissos profissionais misturado com férias compulsórias com a mulher e os bacuris. Agora que deu para ver o peso da obra, ah, isso deu!

Erika Morhy disse...

Amigo, querido, então creio que felizmente estás fora de belém, porque compromissos com o que amamos (e imagino que é seu caso, tanto profissionalmente quanto no âmbito familiar) é sempre um deleite.

E assim estou eu: me lambuzando na terrinha. E não podia deixar de estar na minha agenda a relação com temas tão delicados e importantes como esse. Podemos, pois, fazer uma gincana, lendo artigos e comentando aqui. Tem pano pra manga.

Obrigada por dedicar um tempinho à leitura da postagem em meio a seus fazeres.

Até breve,
Erika