domingo, 9 de dezembro de 2018

Entre bazófias e confidências

     Quando as bazófias ou as confidências de um cirurgião privam-se de procurar histórias dentro de seu espaço glorioso, basta caminhar até uma livraria para sacar um autor e certamente um mosaico áurico, cujo valor ninguém ignora, salta aos olhos. E as linhas douradas vão vangloriar-se bem a sua frente.
       Basta desvirginar as primeiras folhas que as linhas passam a paginas douradas de uma boa leitura, te arrancam do foco da rotina e te põe a gravitar entre o real e o imaginário, como se fosse num filme de astronauta - em visão tridimensional e magnificada - a caminho de uma galáxia desconhecida. 
      Antes que a gente volte ao mundo real, caia e rale os cotovelos, dormitar neste momento anti-newtoniano e planar feito um personagem de Julio Verne, pode fazer de nossas hélices cerebrais uma drone pelo mundo futurista, pelo mundo presente ou mesmo a um passado renascentista.
      E conviver com isso é simplesmente auscultar o frêmito da felicidade em um pulmão tísico.
     Foi o que me aconteceu ao ler o poeta Antonio Moura e alguns de seus poemas. Ele se debruça sobre uma linguagem sagaz ligando pensamentos silábicos a palavras anti-monotonias, que passam pela gente como um sopro e nos proporciona uma delícia que permeia entre a lambida num chocolate amargo da ilha do Combu e a realeza do açaí sem açúcar tirado direto do tacho.
      Num desses sábados, andando por uma das livrarias da cidade, encontrei os livros do poeta. Ali permaneci, em pé, como se levitando no espaço sideral. Abri um deles e enfiei o nariz naqueles versos, para sentir o buquê de sua poesia... Segue Nosferatu:

Quando a lua uiva
sobre sonos e sopra
o pó das sepulturas,
exalo meu perfume e
negro lume, escapo

A capa, asa de negrume
envolve teu corpo, ar
repiando o dorso, car
ícia de brasa gelada

E por fim deixo em tua
pele-página, orifícios,
dupla marca, ver
melho sangue: cravada
   
        E não é que num piscar de olhos o poeta aparece bem à minha frente? Eu estava com o livro “A Outra Voz.” Ele queria autografar, mas não tínhamos caneta. Eu disse: não precisa, poeta. Ele retrucou: é que quando a gente encontra um leitor de poesia a gente acha um diamante.
Estava feita a dedicatória.

Labareda, pelas artérias de Corisco