Nisto Febo nas águas encerrou,
Co'o carro de cristal, o claro dia,
Dando cargo à irmã, que alumiasse
O largo mundo, enquanto repousasse.
Co'o carro de cristal, o claro dia,
Dando cargo à irmã, que alumiasse
O largo mundo, enquanto repousasse.
Camões, em: “Os Lusíadas”
Numa confluência das ilhargas dos Umaris com as
beiradas do Reduto, o bairro das estreitadas ruas de Belém, havia uma edificação que desde tempos idos exalava aroma de Pau Rosa. Criatura dos
irmãos Santiago, lusos que há 90 anos ousaram pôr a floresta em barra escura e
transparente, como as águas do Rio Negro, só para as pessoas se banharem. Deram ao
filho o nome do Deus Sol: Phebo, desarquivado no português arcaico; despregado da
poesia camoniana.
Encravada na Bocaiúva, esquina com a Ó de Almeida, a
Phebo exalava seu aroma de frescor de banho recém tomado, misturando-se às
plumas da sumaúma que completavam a atmosfera européia nos domínios do Deus
Phebo. A nascente foi após o ciclo da borracha amazônica, 1930. Todo o buquê do bairro, ou fumegava pelos esgotos, deixando uma espuma em cada boca de lobo, ou pelas
chaminés, aromatizando boa parte do bairro.
Agora a história é outra. Perdemos parte de nossa
identidade olorosa; não teremos mais a memória olfativa do banheiro de nossos
pais e avós. Ela não mais nos acompanhará. A Phebo fechou suas portas e nossos
esgotos retomarão aos odores da tragédia sanitária inesgotável. Nossa senhora cheirosa nos deixou e os ratos do Reduto voltarão a viver entre garças e urubus ao largo do Ver-O-Peso.
A marca pegou o Ita no Norte e foi pro Rio morar. Sucumbiu à vontade da Granado, nova detentora de seu destino. O rótulo ficou esmagado pela cidade que lhe espremia entre a nova febre imobiliária de um dos mais valorizados bairros da Flor do Grão-Pará.
A marca pegou o Ita no Norte e foi pro Rio morar. Sucumbiu à vontade da Granado, nova detentora de seu destino. O rótulo ficou esmagado pela cidade que lhe espremia entre a nova febre imobiliária de um dos mais valorizados bairros da Flor do Grão-Pará.
Adeus ao Sol e seus odores. Ficamos sob a luz e
suas fragrâncias em nossas narinas profundas da memória. Memória que não se
esquiva de um passado milagroso, temperado pela aeração do bairro e pelos
corredores do passado incólume, farpando o tempo com seus ingredientes de retrospecção em ideias avulsas.
Quem por lá passa e vê os escombros, sente que um
oco ecoa dentro das lembranças. Se desaba um pedaço de nossa história a cada
tijolo demolido, a anosmia das ervas e lavandas, que no últimos anos esteve
ausente da olfação de nossas ruas, agora vira sintoma irremediável.
Se bem que os
deuses poderiam, sob o movimento pendular de turíbulos, esfumaçarem incenso pelos
ares daquelas encruzilhadas, mesmo que contenha apenas uma gota/quarteirão daqueles vapores, mesmo que
nasçam dos esgotos, pois agora são reminiscências que adormecem em nossas pituítas por onde escorriam misturas de perfumes de flores, jasmins e ervas, a céu
aberto.
João Celecindo
e Labareda, ambos do bando de Corisco