terça-feira, 12 de abril de 2022

Por que escrever?


    
        Todos os dias, em silêncio, um verso pede para nascer, sem acordar as crianças. Os primeiros raios apalpam a manhã, mas a vista da janela do quarto em que habito, por esses dias, tem um céu cheio de nuvens acinzentadas que hibernam as montanhas que rodeiam a cidade, batem à minha janela, assim como ofuscam os próprios raios de sol.

Os carros passam para os dois lados, pela mesma via, como se fossem para os mesmos destinos, ou avessos.

Sentado no parapeito da janela olho para fora à cata de mim, incrustado nesse mundo esférico e frenético, que não respeita as leis da natureza. Assim a chuva se impõe em meio ao assombroso tino do horizonte pronto para esconder o dia.

Uma jovem cruza o jardim, elegante, com guarda-chuva colorido, enriquecendo de contraste a fotografia desse dia denso.

Queria era que a beleza d'aurora chegasse leve e breve como convém à anunciação do dia, nascendo de um buraco negro para sugar-me palavras ao redor sem deixar perguntas, dúvidas e incertezas, de modo a cumprir o destino do dia, a sina de escrevinhador e ser questão ante à rima.

Não há som da natureza, apenas o dos carros zanzando para direita e esquerda, açoitando o meu ouvido de primata.

Talvez valha um Milestone no trompete de Mile Davis para que afoguemos o tropeço da revolução industrial ou se apegar a Manoel de Barros: “Sobre o nada eu tenho profundidades”.

Labareda e Corisco.

Nenhum comentário: