quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Non grata

Ontem, o blog do Luís Nassif noticiou a explosão de um escândalo de proporções globais, decorrente da entrada irregular no país de componentes eletrônicos da Cisco Systems – fundada por pesquisadores da Universidade Stanford e uma das maiores multinacionais de tecnologia de comunicações do mundo – sem o devido pagamento de impostos (o conhecido e indevidamente tolerado contrabando).

Uma operação conjunta da Polícia, da Receita e do Ministério Público federais, denominada Persona, desbaratou a quadrilha capitaneada pelo atual e pelo ex-presidente da Cisco no Brasil, Pedro Ripper e Carlos Roberto Carnevalli, e formada por diversos servidores públicos. As acusações, dentre outras, são de sonegação fiscal e contrabando. A fraude, segundo informações da Receita, alcança a cifra estratosférica de R$ 1.500.000.000,00.

Motivados por escândalos financeiros como o da Enron, os EUA promulgaram, em 2002, a Lei Sarbanes-Oxley, que criou mecanismos visando coibir a conduta antiética de diretores e auditores de empresas. A americana equivale à nossa Lei n. 7.492/86, a famosa Lei do Colarinho Branco, mas com uma abrangência bem maior: a gestão fraudulenta coibida pela LCB é somente aquela vinculada a crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, contrariamente à Sarbanes-Oxley, além desta prever mecanismos de defesa contra fraudes contábeis e fiscais, não se limitando a definir crimes e cominar penas aos envolvidos.

O momento é propício para se discutir e propor normas de tal natureza em nosso sistema legislativo. O direito brasileiro possui um capítulo tímido sobre o assunto no Código Civil de 2002. O estabelecimento de regras rígidas de combate e, principalmente, prevenção à má gestão e à sonegação tornaria saudáveis as relações comerciais, com favorecimentos óbvios à população e, ainda que menos evidentes, também ao consumidor. A concorrência leal seria resguardada, modernizando o capitalismo brasileiro e protegendo os investidores – inclusive os pequenos.

Cogita-se que o emprego de meios ilegais tenha sido um modo da Cisco recuperar fôlego perante a Huawei, concorrente chinesa que lhe vem impingindo seguidas derrotas no mercado brasileiro de telecomunicações (se você, por exemplo, usa o produto Velox, certamente tem um modem Huawei conectado à sua linha telefônica). Recentemente, uma ação da Receita Federal autuou supermercados paraenses por supostas fraudes em softwares de máquinas registradoras, cambiados para possibilitar a sonegação de tributos (o fato ensejou o postPersistindo no erro”).

A existência de uma lei rígida contra maus gestores de negócios privados teria certamente evitado esta possível segunda incursão dos supermercadistas locais no crime.

3 comentários:

Carlos Barretto  disse...

FRJ.
Quanto ao modem ADSL, adquiri o meu próprio e utilizo D-Link. Apenas por questão de preço, muito embora nada tenha a reclamar de seu funcionamento. Em nada me incomodaria em utilizar um equipamento da Cisco, não fossem eles algo mais onerosos do que os da D-Link.
Aquela coisa feia que a Telemar disponibiliza, com toda a certeza, pode não ser páreo para os produtos da Cisco, que no ambiente doméstico são também chamados de Linksys, uma subsidiária da Cisco.
Embora D-Link, Cisco e Huawei fabriquem produtos que em tese fazem a mesma coisa, o que os diferencia certamente á algo que em nosso uso doméstico é transparente aos olhos: tecnologia onboard, funcionalidades do "firmware" embutido nos roteadores e modems ADSL, qualidade dos componentes eletrônicos associados aos produtos (o que garante a longevidade de seu funcionamento), suporte técnico, updates de firmware, entre tantos outros diferenciais.
Não podemos esquecer que modems ADSL e roteadores são equipamentos projetados para funcionar 24 h sem descanso. O meu vive ligado. E nas empresas e operadoras de banda digital também. No ambiente corporativo, sempre muito sensível ao balanço risco x benefício, as escolhas do pessoal de TI geralmente recaem sobre os equipamentos capazes de render mais horas de vôo, que atendam suas necessidades específicas, com bom preço e o indispensável suporte técnico.
Mas daí para entender que a Cisco do Brasil tenha se "sentido obrigada" a entrar em esquemas de contrabando para esmagar a concorrência, é algo chocante.
Quase incompreensível tendo em vista a tradição e reconhecida qualidade de seus produtos.
Deve haver mesmo motivação local para tanto.
Inclusive e talvez principalmente de quem receptou a muamba.
Abs

ASF disse...

Ótimo post.

Quanto ao Velox, mesmo que você não tenha o modem da marca Huawei, certamente estará utilizando os equipamentos da companhia chinesa uma vez que a rede da Oi (antes Telemar), para oferecer o serviço do Velos, é essencialmente construída com equipamentos desse fornecedor.

São equipamentos realmente muito bons e com um preço que em geral corresponde a 1/3 de solução equivalente da Cisco.

A Huawei pode até ser considerada de certa forma uma spin-off da companhia americana, já tendo inclusive enfrentado processo por desrespeito a propriedade intelectual da Cisco.

Mais especificamente por copiar o seu sistema operacional, o IOS.

Abraço,

ASF
http://antoniofonseca.wordpress.com

Francisco Rocha Junior disse...

Barretto,
A cogitação é de algumas mídias que li, inclusive do blog do Nassif. Não descarto a hipótese; sabe-se lá que tipo de pressão os dirigentes destas empresas recebem para atingir resultados. O caso da Enron é modelar: nunca se imaginou que a empresa pudesse estar maqueando balanços, dada sua imagem de solidez.
Também não descarto ganhos de diretores na receptação do material contrabandeado, mas dada a cultura destas empresas e seus "chairmans", acho esta hipótese um pouco menos viável.
O fato é que a Huawei, como bem exemplificou o ASF, vem batendo a Cisco nas concorrências brasileiras. E aqui falamos de alguns milhões de dólares, o que acaba, na cabeça de alguns, justificando as ilegalidades.