E para os que ficam? A lembrança basta? Ou gostariam que o ente querido tornasse à vida, para reocupar o espaço deixado e que supunham jamais seria preenchido?
Este é um dos motes que embalam o filme Os Retornados, a respeito do qual postei uma nota de serviço na última sexta-feira.
No filme, três histórias são destacadas: o retorno na infância, na fase adulta e na velhice. Em uma delas, a pessoa retornada é o filho de 5 ou 6 anos de um casal, cujas circunstâncias da morte não são esclarecidas. São desta trama os melhores momentos do filme.
Em um deles, pai e filho estão brincando com o cachorro da família; em determinado momento, o pai destaca o fato de que quando o menino partiu, o cão era filhote, e agora já é adulto, mas mesmo passados quatro anos da morte da criança, quando o viu, lembrou dele no mesmo instante. O menino não havia sido esquecido por ninguém.
Em outro, o menino demonstra-se nitidamente deslocado do ambiente familiar. Aquele não era mais seu mundo. Disposto a fugir, joga-se da sacada do apartamento onde mora. A mãe, em conflito com o pai em razão justamente do despertencimento do filho – ela defendia que a criança deveria ser deixada livre para empreender a fuga pretendida – vê o menino se jogar da janela e nada faz, porque acha que assim o deixaria ser feliz.
Deste modo, a ausência do ente querido, com o passar do tempo após sua morte, consolida o sentimento de resignação dos envolvidos. O retorno do morto, após tanto tempo, representa algo mais difícil de se lhe dar que a própria morte. A conclusão a que se chega é de que a morte, ainda que dolorosa, é, além de inevitável, necessária. E que o homem, em sua infinda capacidade de adaptação, só não se adapta ao que não é natural.
13 comentários:
Ars longa, vita brevis. Na versão latina do primeiro aforismo de Hipócrates está a síntese da busca da imortalidade pelos homens.
Muito bem dito, Oliver. Daí porque o homem faz prova de seu valor por aquilo que deixa de herança às gerações futuras.
Abs.
Excelente fundamentação. Apesar do objetivo talvez diverso de sua postagem, lembrei-me de uma mesa redonda da qual participei em Recife, sobre a eterna questão da terminalidade da vida, pacientes terminais e ortotanásia.
Infelizmente, pouquíssimos estão dedicando seu tempo a elaborar suas concepções sobre a morte ao longo da vida. Nem os que se dizem católicos (a igreja católica apesar de seus inúmeros entraves dogmáticos, tem um positivo posicionamento a este respeito quando fala em "obstinação terapêutica"), conseguem ter pleno entendimento sobre terminalidade da vida.
Mais difícil ainda, estabelecer este debate à cabeceira do leito de um paciente terminal e seus familiares.
E por consequência, temos moribundos ocupando preciosos leitos de UTI, perda de potenciais doadores de órgãos, entre outras consequências menos nobres ainda.
E temos também, mesmo entre alguns profissionais de saúde, dificuldades na aceitação e principalmente no gerenciamento da terminalidade.
Somente quando a sociedade, os médicos, os legisladores sentarem para discutir amplamente este assunto polêmico e palpitante, poderemos ver algumas consequências positivas.
Esse assunto é daqueles... uma pedreira pra quebrar. Mas, tem de ser pautado pela área da saúde. Aliás, médico não entende, nem quer entender nada de morte. De um modo geral, o médico não discute a morte e o morrer na sua formação.
Vale um post dos médicos, não é? Por que não discutir a morte sob a perspectiva daqueles que a encaram no seu dia-a-dia?
Vou tentar elaborar um outro, FRJ. Mas já falei sobre ortotanásia em posts de outubro de 2006, na época em que o CFM aprovava resolução sobre o assunto, que a Justiça acabou por obstar, não sei em que nível, recentemente.
Dei até entrevista ao jornal do CRM local, opinando sobre este assunto de muito interesse aos intensivistas.
Mas é como Oliver diz: uma pedreira daquelas.
Há muitas concepções equivocadas em vários setores da sociedade (incluídos os da área da saúde) a serem digamos, debulhados, de maneira a avançar no assunto legal.
Há países que já resolveram esta questão.
Vi o filme Francisco, e concordo em grande parte com o que escreveste com exceção da parte em que falas da mãe que deixa o filho partir pq acha que assim o deixaria feliz. Ao contrário, entendo que em uma atitude extremada de egoísmo e desespero ela o prefere morto. Não reconhece mais no retornado o ente querido e sofre com o presença *ausente*.
Tu escreves lindamente ;-)
Só por isso vale o filme, que assistiria se aí estivesse. Confronta a memória "congelada" da mãe com uma realidade que para ela é impossível e, portanto, intolerável. É o confronto do mito materno com a natureza substancial da vida. A morte fica noutro plano, quase incomunicável, quando tratamos de valores cristãos.
Anônimo(a) das 23:16hs, pode ser que tua interpretação esteja correta. Mas não concordo que haja egoísmo no sentimento da mãe. Afinal, a segunda perda também é dolorosa - talvez até mais que a primeira - e alguém agindo por egoísmo não iria querer sentir algo parecido. Vejo egoísmo, ainda que não deliberado, nas atitudes do pai, que queria manter a qualquer custo o filho sob seu julgo e proteção.
Obrigado pelo elogio... mas acho que nesta tu entregaste tua identidade... ;-)
É verdade.
Discordo novamente, Francisco...mas isso a gente deixa pra discutir em casa ;-))
Ate tu, Oliver?
Ok, anônima identificada. Discutirei com o maior prazer.
Bj.
Pois é, anônima. Aqui nos estamos com a macaca (risos)! Apareça sempre.
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