sexta-feira, 16 de julho de 2010

O Anticristo de Lars von Trier


Assisti ontem a O Anticristo, filme do dinamarquês Lars von Trier, com Charlotte Gainsbourg e Willem Dafoe. O filme é dividido em capítulos, como uma obra escrita: há um prólogo e um epílogo, somente com cenas em preto e branco e a ária Lascia Chio Pianga, da ópera Rinaldo, de Georg Friedrich Händel, como música-tema. Entre estes dois trechos, quatro capítulos, intitulados Luto, Dor, Desespero e Os Três Mendigos.

Charlotte Gainsbourg e Willem Dafoe formam um casal que tem um único filho, ainda pequeno. O menino morre ao cair da janela do apartamento enquanto seus pais transam, o que faz com que a mulher caia em profunda depressão. Passado o trauma inicial, o personagem de Dafoe (somente a criança tem nome – ou melhor apelido: Nic), um psicólogo, tenta tirar sua mulher do estado depressivo. Para isto, vão para uma cabana no meio de uma floresta chamada Éden, onde passarão dias sozinhos, a mulher afundando na loucura, o homem tentando, em vão, tirá-la da demência.

Faz tempo que assisti a Cenas de Um Casamento, de Ingmar Bergman. Porém, os primeiros capítulos do filme de von Trier me remeteram imediatamente ao clássico do diretor sueco: muitos closes, imagens sem trilha sonora, cenas de diálogos pausados entre os personagens. À medida em que a história evolui – começa pesada e se aprofunda no desespero e na dor, física inclusive –, há trechos que passam a lembrar O Iluminado, de Stanley Kubrick. Ao final, von Trier dedica seu filme a Andrei Tarkovsky, cineasta russo que marcou seus filmes por um traço espiritual inequívoco.

Ocorre que O Anticristo nada tem de espiritual; ou melhor, tem, mas não no sentido hagiológico, ou religioso. O Anticristo que dá nome à película está no interior dos personagens, em especial da mulher, cuja loucura evolui a partir dos medos que ela aponta sentir ao marido, por este estimulado em simulações psicológicas, e que chega ao ponto de tomar conta completamente de suas ações. A floresta do Éden não é o paraíso; é, ao contrário, o verdadeiro inferno, onde não há as distrações que a vida em sociedade proporciona e os personagens estão isolados, entregues unicamente a seus pensamentos.

Não é um filme facilmente digerível: há cenas fortes de sexo e tortura. Até a lindíssima ária de Händel, que inicia e conclui o filme, incomoda. Mas vale a pena a visita, digamos assim.

2 comentários:

Scylla Lage Neto disse...

Francisco, obrigado pela dica - vou checar o filme.
De Tarkovski assisti Solaris (baseado no livro de Stanislaw Lam que eu adoro) e O Sacrifício. O primeiro me marcou muito.
Confesso que ando meio avesso a cenas fortes, principalmente de violência, mas sua postagem e a belíssima ária me estimularam a ver O Anticristo.
Um abraço.

Francisco Rocha Junior disse...

Assista, Scylla. Mas tome um omeoprazol antes...