quinta-feira, 8 de julho de 2010

Um debate sobre segurança pública

Por motivos óbvios, o debate sobre violência e segurança pública nunca deixou de estar na ordem do dia, no Brasil. Mais ainda no Pará, cuja capital é uma das cidades mais violentas do país.

Em tempo de eleições, é mais ainda previsível que a discussão grasse e, muitas vezes, em um nível baixíssimo. Por isso, quando o debate é republicano, como se costuma dizer, é necessário difundi-lo, para que todos dele participem e nele expressem sua opinião.

O professor Fábio Castro, ex-secretário de Comunicação do Estado, fez uma interessante provocação sobre o tema em seu Hupomnemata. Um anônimo gostou do repto e puxou o fio. Tomara que o debate vá longe, e no mesmo nível em que começou.

Entenda como tucanos e democratas aumentaram em 195,8% a taxa de homicídio de crianças e jovens no Pará

Resumindo algumas informações do Mapa da Violência, citado no post anterior.
Os dados mais recentes são referentes ao ano de 2007. Observando a linha histórica que vai de 1997 até esse ano, temos o resultado da política demo-tucana de segurança pública. Uma década perdida para o Pará. Nesse tempo, o estado passou da condição de 20º estado mais violento do país para a de 7º mais violento.
As taxas de homicídio para cada grupo de 100 mil habitantes subiram 130,3% na década demo-tucana. Em Belém, exclusivamente, elas subiram 74,6%. Considerando a região metropolitana de Belém, o crescimento do número de homicídios na década tucana foi de 121,8%, o segundo maior do Brasil.

O maior sinal de falta de compromisso e de incompetência dos tucanos, no entanto, se dá quando se lê os dados referentes aos homicídios de crianças e adolescentes. Na faixa da população que tem entre 0 e 19 anos, o número de homicídios cresceu, durante a década demo-tucana, 195,8%. Em 2006, por exemplo, 352 crianças e adolescentes foram assassinados no Pará. Foi o quinto maior crescimento desses índices, dentre os estados brasileiros. Em Belém, essa variação foi de 60,4% e na região metropolitana foi de 122,5%. Para se ter um elemento de comparação, poide-se observar que, em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, houve quedas expressivas nas taxas de homicídio de crianças em jovens no mesmo período: - 31,6% e – 65,5%, respectivamente.

Como o Pará chegou a essa tragédia? Olhem para os governos do PSDB e do DEM que eles dão a receita perfeita para matar crianças e jovens: sucatear as escolas, desgastar a carreira docente, ausência de políticas para a juventude, esporte e lazer, política cultural que perde de vista seu compromisso social, política de comunicação que se pretende como marketing, e não como política social, esquecer das políticas de saneamento e moradia. Sim, e além disso passar dez anos, dez anos inteiros, sem aumentar o efetivo policial, sem comprar equipamentos e sem treinar as polícias.

Segue o comentário do anônimo:

Sim, conhecemos nossos problemas históricos e sabemos bem dar nome aos "bois", apontar os responsáveis por nossas mazelas sociais.

Mas, tratando-se de partido, questiono se o governo petista promoveu realmente uma ruptura com o modo de fazer política das outras legendas e/ou das gestões anteriores.

As mudanças necessárias - aquelas de longo prazo que não rendem votos imediatos nem são tão atraentes nos jornais institucionais - foram e estão sendo feitas efetivamente a ponto de nos tranquilizar a respeito de melhora dos indicadores para os próximos anos ou décadas. Duvido muito.

Além disso, falar de comunicação que se pretende como marketing depois da sua saída do governo, tal como foi, parece brincadeira. De mau gosto.

Nos moldes atuais, o uso político de todo aparato técnico da Comunicação pelo governo não pode ser tratado lá como uma política pública de interesse social, que mereça ser tratada como um ponto a favor dessa gestão em detrimento da anterior.

Ainda que os avanços existam em termos de profissionalização, há distorções entre o potencial que essas políticas teriam e a sua função atual.

Como apontou o Barbero numa entrevista ao Roda Viva há alguns anos, na América Latina vivemos uma crise que abarca não apenas a política, mas o político.

Vejo com ressalvas as críticas em relação ao modus operandi antigo, quando muito disso ainda se perpetua, independente de quem está no governo. Os nossos grupos políticos estão viciados e, do ponto de vista ético, certas alianças e coalisões inter e intrapartidárias são injustificáveis, sendo mais abusivos ainda os desdobramentos disso na realidade, no que tange o estabelecimento de políticas que afetam – ou deixam de afetar como deveriam – a vida do cidadão comum, acostumado a não tirar nenhum proveito e nem usufruir dos serviços e as benesses que deveriam ser públicos.

As elites econômicas são as mesmas e elas têm um poder enorme no cenário de tomada de decisões, mantendo-se como “posição” independente dos partidos que estejam no poder. Elas definem regras quem poucos ousam confrontar.

Agora, me diga, esse potencial de destruição da sociedade é privilégio de alguns partidos políticos ou resulta das distorções da política, do político, do público, as quais nos acostumamos a assistir e mesmo a pactuar, como se fossem “naturais” em nome da governabilidade e de supostos projetos de governo , sempre considerados transformadores, ao menos aos olhos de seus planejadores?

Realmente, eu não consigo ver sentido em usar partidos como categorias dessa análise política. Pode ser fruto de uma "inconsistência" intelectual minha, mas me atrevo a questionar se outras categorias não nos ajudariam a entender melhor as rupturas e continuidades históricas e políticas que se dão no nosso estado.

Precisamos de novas enzimas para "ruminar" adequadamente essa realidade truncada, que nos mantém ora perplexos ora paralisados, enquanto o tempo e as possibilidades de mudanças escoam ralo abaixo, tornando inclusive a nossa capacidade de predição cada vez mais pessimista, quando não embotada.

Sim, conhecemos nossos problemas históricos e sabemos bem dar nome aos "bois", apontar os responsáveis por nossas mazelas sociais.

Mas, tratando-se de partido, questiono se o governo petista promoveu realmente uma ruptura com o modo de fazer política das outras legendas e/ou das gestões anteriores.

As mudanças necessárias - aquelas de longo prazo que não rendem votos imediatos nem são tão atraentes nos jornais institucionais - foram e estão sendo feitas efetivamente a ponto de nos tranquilizar a respeito de melhora dos indicadores para os próximos anos ou décadas? Duvido muito.

Além disso, falar de comunicação que se pretende como marketing depois da sua saída do governo, tal como foi, parece brincadeira. De mau gosto.

Nos moldes atuais, o uso político de todo aparato técnico da Comunicação pelo governo não pode ser tratado lá como uma política pública de interesse social, que mereça ser tratada como um ponto a favor dessa gestão em detrimento da anterior.

Ainda que os avanços existam em termos de profissionalização, há distorções entre o potencial que essas políticas teriam e a sua função atual.

Como apontou o Barbero numa entrevista ao Roda Viva há alguns anos, na América Latina vivemos uma crise que abarca não apenas a política, mas o político.

Vejo com ressalvas as críticas em relação ao modus operandi antigo, quando muito disso ainda se perpetua, independente de quem está no governo. Os nossos grupos políticos estão viciados e, do ponto de vista ético, certas alianças e coalizões inter e intrapartidárias são injustificáveis, sendo mais abusivos ainda os desdobramentos disso na realidade, no que tange o estabelecimento de políticas que afetam – ou deixam de afetar como deveriam – a vida do cidadão comum, acostumado a não tirar nenhum proveito e nem usufruir dos serviços e as benesses que deveriam ser públicos.

As elites econômicas são as mesmas e elas têm um poder enorme no cenário de tomada de decisões, mantendo-se como “posição” independente dos partidos que estejam no poder. Elas definem regras quem poucos ousam confrontar.

Agora, me diga, esse potencial de destruição da sociedade é privilégio de alguns partidos políticos ou resulta das distorções da política, do político, do público, as quais nos acostumamos a assistir e mesmo a pactuar, como se fossem “naturais” em nome da governabilidade e de supostos projetos de governo , sempre considerados transformadores, ao menos aos olhos de seus planejadores?

Por favor, me dê uma aula de Sociologia, Ciência Política ou mesmo uma bofetada (teórica, no caso), se for preciso e puder responder a essas questões que muito me angustiam, como cidadão e ser humano.

14 comentários:

Itajaí disse...

Quais são os números da violência do governo Ana Júlia? Isso é fundamental para comparar e prosseguir a discussão e superar o viés do achismo.

Itajaí disse...

Apresentadas com referências, pois depois do caso da musiquinha e do prontuário da Dilma Roussef, os espiroquetas estão mais inventivos que nunca.

Francisco Rocha Junior disse...

Caro Itajaí,

vamos ver se alguém se apresenta e exibe os números. Se o portal do governo estivesse positivo e operante, talvez os tivéssemos.

Yúdice Andrade disse...

Se o povo brasileiro quisesse mesmo conhecer a realidade, teria interesse em aprofundar a sua compreensão sobre esses dados, que espelham a violência das ruas. É o que caracteriza o analfabeto funcional: até lê e escreve, mas não processa as implicações daquilo que lê ou escreve.
Vendo os textos, eu mesmo me sinto bastante analfabeto, a começar pelo fato de que, embora tenha conhecimento da existência do mapa da violência, não o examinei. É uma vergonha para mim. E um temor, porque nos sugere prognósticos terríveis.
Somo o meu desejo de que o debate realmente prossiga no nível em que começou. Porque precisamos disso.

Itajaí disse...

O Francisco chama atenção para um fato importante, que é a acessibilidade à informação como elemento integrante da cidadania. Lembro que na época dos governos tucanos no Pará, por obrigação da atividade que exercia à época e mais por inquietação intelectual, eu sempre ia as páginas da Secretaria de Segurança para acompanhar a evolução da violência no estado. A informação esteve lá por um longo tempo, atualizada com regularidade para minha curiosidade. Mas eis que de súbito, puf, sumiu sem qualquer aviso e sem retorno.

Francisco Rocha Junior disse...

Itajaí, o portal do Governo voltou. A página da SEGUP, porém, continua fora do ar.

Saul Carneiro disse...

Caros amigos flanares, quero destacar um ponto do comentário postado "Vejo com ressalvas as críticas em relação ao modus operandi antigo, quando muito disso ainda se perpetua, independente de quem está no governo. Os nossos grupos políticos estão viciados e, do ponto de vista ético, certas alianças e coalisões inter e intrapartidárias são injustificáveis..."
Acho oportuno isso pois há uns três meses perdi um amigo assassinado covardemente dentro de seu carro em um assalto, dois dias depois eu estava em um bar e na mesa ao lado da minha se regozijavam altos quadros do PT com outros igualmente altos do PMDB, em meio a brincadeiras de convites para ocupação de cargos e coisas do tipo.
Impressionou-me que em momento algum aquelas pessoas se importavam com quem estava ao lado vendo e ouvindo aqueles comentários e negociatas fisiológicas.
Pensei com meus botões: "esses caras não estão nem ai para pessoas que morrem todos os dias como o meu amigo ou para qualquer um que esteja seguindo com suas vidas ordinárias e simples"
Tive a certeza absoluta que não são os partidos políticos e sim essa classe (geração) escatológica de gente como os que temos nas várias esferas do governo federal, estadual e municipal que fazem com que precisemos viver um inferno por dia não só em Belém como no Pará e no Brasil.
Logo não atribuo méritos ao atual governo caso seus números sejam menores que o governo antigo, para mim eles se igualam na mesma forma rude e preguiçosa de fazer política.

Francisco Rocha Junior disse...

Saul,
Costumo dizer que falta formação humanística em nossa sociedade. O problema é cultural, da cidadania que, infelizmente, no Brasil não se aprende na escola.
Enquanto não subvertermos esta realidade, teremos uma economia pujante, mas não um povo cidadão.
Obrigado pela visita e comentário.

hupomnemata disse...

Olá a todos,

Obrigado por replicarem meu post aqui no Flanar. Para esclarecer: Os dados que coloquei foram apurados pelo Instituto Zangari, que há dez anos publica o seu Mapa da Violência - Anatomia dos Homicídios no Brasil. É uma instituição séria.

O último ano apurado foi 2007, por isso ainda não há dados referentes a anos mais recentes do governo Ana Júlia. De qualquer forma, não se pense que haverá uma mudança tão rápida na questão da violência. O que quero dizer é que uma política de segurança ostensiva não é suficiente para reduzir, efetivamente/sustentavelmente os índices da violência. O que é necessário é o investimento em políticas sociais. Os grandes exemplos de combate à violência dão conta disso.

O governo AJ tinha um programa de política de segurança social, o Segurança Cidadã, mas a urgência do combate à criminalidade exigiu que a maior parte do orçamento fosse destinada, de fato, à segurança ostensiva, sobretudo às operações policiais. Não penso que seja o ideal, mas percebo que foi o politicamente possível.

Por tudo isso, o impacto não será imenso. Porém, terá impacto, nos números futuros, certamente, a contratação de mais de 2 mil policiais. Fazia 10 anos que não havia contratação, e a população do Pará, ainda que menos que a criminalidade, subiu bastante nesse tempo.

Carlos Barretto  disse...

O fato é, que "na prática" pude constatar o seguinte:
1) A polícia está de fato nas ruas, em proporção muito maior que há tempos atrás.
2) Não temos dados atuais. Mas não me espantaria em não termos tido nenhuma redução na criminalidade.
No sequestro que me vitimou junto com 3 amigos há cerca de 3 semanas atrás, durante nosso angustiante trajeto com os bandidos pelas ruelas da Cremação, meu carro cruzou com ao menos 1 viatura policial.
Juro que torci para que eles não detectassem o crime que estava se desenrolando. Afinal, nossos meliantes eram todos adolescentes (3). E o que estava com a arma apontada para a minha cabeça, era justamente o que estava mais nervoso e recomendou enfaticamente que não fizéssemos qualquer sinal. Com o carro peliculado, de alguma maneira os PMs não puderam observar o que já estava em curso. Isto levou-me a terceira conclusão, que nada tem de científico, sendo tão somente uma conclusão de um único caso: não botarei mais película no próximo carro que adquirir. Pode parecer contraditório, mas penso que talvez a presença da película, seja mesmo até um bom motivo para que os meliantes escolham a sua vítima.

Abs

Yúdice Andrade disse...

A película influencia, sim, Barretto. Mas reza a lenda que os ladrões dão preferência aos carros cujo interior podem ver bem, para evitar situações inesperadas. Ou seja, o carro sem película seria mais visado.
Não posso ofertar números sobre isto, mas essa é uma afirmação corrente, inclusive entre policiais.

Carlos Barretto  disse...

Sabia disso também, Yúdice. Por isso apliquei-a no meu carro e no de minha ex-esposa.
Mas juro pra vc, que com esta experiência desagradável, fiquei com impressão contrária. Achei os bandidos bem à vontade no interior do carro. Onde até acharam por bem, acender um cigarro, enquanto cruzávamos uma viatura policial.
Falando nisso, este é um serviço que os órgãos de segurança e/ou instituições de ensino locais não nos prestam. Uma análise constante, com bases científicas, do modus operandi dos bandidos, de maneira a fornecer aos cidadãos informações concretas sobre como de fato se prevenir destas situações. Algo além do "achismo". Procure em algum sítio local e vc verá que estas informações simplesmente não estão disponíveis para o público.

Abs

Itajaí disse...

Olá, Fábio.
Eu conheço a série estatística referida. O ideal é aguardarmos o consolidado dos quatro anos de governo de AJ. O ideal seria acompanhar-se de relatório da SSP com respeito ao mapa da criminalidade no Pará, com dados qualitativos que identificassem tipos de crime, localização geográfica, modus operandi, corrupção policial, etc. Não sei se existe esse documento.
Outro aspecto importante a avaliar é a influência da situação operacional do Judiciário na questão da violência, mas aí não é mais um documento de gestão e sim de pesquisa acadêmica. Fica a dica.

Francisco Rocha Junior disse...

Caro Fábio,

Obrigado pela tua participação aqui no Flanar. Teu comentário irá à ribalta, como dizia o Juca, para dar continuidade ao debate, se os leitores assim o desejarem.

Abraços.