Por Lúcio Flávio Pinto, jornalista
Arthur Chiara, com menos de um mês no cargo de ministro da Saúde, já se
imortalizou. Será lembrado para sempre como o autor de uma das frases mais debochadas
da história da saúde pública no Brasil. Ele disse que o Mais Médicos é o
"maior programa de provimento de médicos da história da humanidade".
É um
rompante que pode ser comparado ao do deputado Francelino Pereira. No auge da ditadura militar, ele disse que o partido que presidia, a Arena (Aliança Renovadora Nacional), cuja passividade a fez merecer o título de "partido do sim, senhor", era, na verdade, "o maior partido político do Ocidente".
rompante que pode ser comparado ao do deputado Francelino Pereira. No auge da ditadura militar, ele disse que o partido que presidia, a Arena (Aliança Renovadora Nacional), cuja passividade a fez merecer o título de "partido do sim, senhor", era, na verdade, "o maior partido político do Ocidente".
O novo ministro de Dima Rousseff recorreu à grandiloquência para
esconder a nudez do rei. Negou que a fuga de médicos cubanos, a insubmissão de
um deles, Ramona Rodriguez, que entrou na justiça contra o programa, a iminência de uma ação do Ministério Público Trabalhista e as críticas políticas tivessem influído na decisão do governo de mudar a remuneração dos médicos cubanos. Eles recebiam, no Brasil, 10 vezes menos do que os demais médicos estrangeiros,
além de sofrerem diversas limitações e constrangimentos exclusivos, que jamais
um país independente (e decente) imporia a estrangeiros em seu território.
O reajuste será de 300% a partir deste mês. Além dos 400 dólares que
recebiam no Brasil, os médicos cubano passarão a ter direito aos US$ 600 que eram depositados em nome deles em Cuba acrescido de
US$ 245. O novo valor nivelará à bolsa à bolsa paga pelo governo a um médico
residente nacional.
Os profissionais brasileiros mal (ou
pessimamente) remunerados pelo mesmo governo podiam valer-se desses precedentes
para suas campanhas de melhorias de sua remuneração e de suas condições de
trabalho. A grandiosidade e a generosidade expressas pelo ministro da saúde são
raríssimas nos gestores públicos. Se bem que o novo pagamento feito aos médicos
cubanos apenas equivalerá aos gastos com sua hospedagem e alimentação. Esse
item é bancado pelas prefeituras dos municípios onde os médicos atuam.
Com suas lentes de aumento (cor de rosa), o ministro Chioro encheu a
boca para declarar o programa, com 9,4 mil médicos, dos quais apenas dois mil não são cubanos, como o maior da história da humanidade. Logo depois de ter dado um toque de humanidade ao Mais Médicos, por sua brutal desumanidade, agora retocada e atualizada às péssimas condições da saúde no Brasil. Tão ruins,
por fatores endógenos, que fizeram os brilhantes estrategistas conceberem a importação de médicos como a única solução, embora externa.
Mas há um detalhe importante que subsiste a todas as tentativas feitas
para corrigir o programa. Por que os médicos cubanos não foram inscritos diretamente no Mais Médicos, como todos os outros estrangeiros que aceitaram o chamado
do governo brasileiro? Por que tiveram que aderir ao acordo assinado pelo Brasil com a Organização Pan-Americana de Saúde e esta com a Mercantil Cubana de Serviços Médicos Cubanos S/A, uma obscura empresa privada?
A justificativa é de que esse modo adotado por Cuba em todos os países
para qual enviou seu esculápios. A parcela do médico depositada em Cuba, junto
com todas as medidas restritivas que lhe foram impostas e a vigilância de um observador (a "máxima direção da missão cubana no Brasil”; talvez um
agente do eficiente serviço secreto cubano?), seria a garantia do retorno
dessas pessoas não seu país de origem. Como grande parte do que o país
hospedeiro paga é retida pelo governo cubano, a exportação de médicos se tornou
uma das maiores fontes de renda do país.
É mais rentável do que exportar minério de ferro, soja ou carne animal.
Mas, nas condições do acerto, equivale a exportar carne humana qualificada, como se a escravidão ainda subsistisse.
O governo tentou retocar o impacto negativo que a revelação do conteúdo do "acordo" provocou. Alegou que os médicos cubanos estavam
recebendo bolsas, conforme lei aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pela
presidente da república. Médicos formados há muito tempo e atuando diretamente
nos municípios recebendo bolsas, como iniciantes?
O Brasil, que foi o país que por mais tempo adotou a escravidão
africana, suprimindo-a meio século depois da gigante Inglaterra, não pode-se permitir servir de instrumento para essa nova ignomínia, ainda que maquilada e de serventia nacional.
Lucio Flavio Pinto é jornalista e
editor do “Jornal Pessoal”.
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