O Supremo Tribunal Federal, ao aplicar a lei que rege o direito de greve na iniciativa privada aos servidores públicos, deu provas de mais do que nunca estar se convertendo de mero aplicador de leis em verdadeiro criador legislativo. Esta tendência vem sendo sentida há tempos. Destaco, dentre este momentos, as discussões empreendidas no julgamento de medida liminar requerida na ação em curso pelo Supremo, que defende que mulheres grávidas de fetos anencefálicos possam abortá-los: quando for julgada em definitivo, e se a decisão fixar-se pela procedência do pedido, o STF inaugurará uma nova modalidade de aborto legal, não prevista no Código Penal.
A questão, na realidade, não é nova. A novidade é a mais alta Corte do país passar a adotá-la como procedimento válido. Alguns órgãos judiciários há muito vêm adotando tal postura - em alguns casos para o bem, como no reconhecimento de uniões estáveis de casais homossexuais e seus efeitos jurídicos; outros, em meu ver, para o mal. Nesta última hipótese, situo, por exemplo, o Enunciado n. 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que faz tábula rasa (como se diz em bom juridiquês) do art. 71, § 1o., da Lei de Licitações e propicia a condenação subsidiária da Fazenda Pública, quando o empregado de empresa terceirizadora de serviço não receba as parcelas a que tem direito de seu empregador direto.
No caso do direito de greve dos servidores públicos, o STF cansou definitivamente de esperar que o Executivo e o Legislativo propusessem e votassem um projeto de lei que definisse as regras para a paralisação do trabalho no Serviço Público, conforme exige o art. 37, inciso VII da Constituição Federal. A previsão de lei específica faz parte do texto constitucional desde sua promulgação. A fim de facilitar o processo legislativo, a Emenda Constitucional n. 19, de 1998, modificou a expressão lei complementar, que constava ao final do inciso, por lei específica: em lugar de ato que demandava processo legislativo mais complexo, inclusive com quorum qualificado, a Constituição passava a exigir simplesmente a regulação do direito de greve por lei ordinária, de mais simples condução.
Nem assim, o Congresso se dignou em resolver a pendência. Daí que o Supremo resolveu por si próprio a lacuna: determinou a aplicação aos servidores públicos das normas que já vigiam em relação aos empregados da iniciativa privada.
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