terça-feira, 7 de outubro de 2008

Opinião de um juiz

A democracia é ótima porque possibilita a participação ativa de todos os personagens sociais na construção de uma sociedade melhor. As pessoas podem, ao menos, falar, espernear, reclamar e exigir mudanças, seja pelo voto, seja pelos diversos canais de propagação de idéias.

Nesta realidade, defendo sempre que é de suma importância saber como pensam os magistrados. A classe, que vive ultimamente entre o céu e o inferno na opinião pública, foi durante muito tempo encastelada, vivendo sob o célebre vaticínio de que somente poderia falar "nos autos".

Ultimamente, porém, uma parcela da magistratura com visão crítica, diversa do tradicionalismo que durante tempos fez (e ainda faz, infelizmente) maioria no Judiciário, vem exprimindo opiniões sobre os assuntos que importam à sociedade brasileira. Em nosso Estado, o desembargador federal José de Alencar, do Tribunal Regional do Trabalho da 8a Região, corte com jurisdição sobre o Pará e o Amapá e sede em Belém, mantém um blog, o Blog do Alencar, em que não se furta de bolas divididas.

Pouco antes da minha última pausa, aqui no Flanar, publiquei o post Pensata, cujo mote era uma postagem do Blog do Alencar. Dentre outros comentários, um visitante anônimo deixou o seguinte:

É correto um juiz do trabalho emitir tais conceitos contra uma empresa que faz parte do seu elenco de julgamento?
Qual isenção tem um juiz que possui o conceito externado em relação a Vale, quando aprecia processos que envolvem a citada empresa?

Bendita a democracia, que nos permite discordar, discutir e expressar opiniões, as mais diversas possíveis, sem o risco de ser processado ou preso por ter idéias diferentes. Afinal, a discussão é boa; aliás, é ótima.

Já expus a minha opinião. E a sua, qual é?

5 comentários:

Val-André Mutran  disse...

A suspeição se daria se houvesse o fato concreto. Não há, portanto, o anônimo critica por criticar, o que é seu direito.
Direito que também está franqueado ao desembargador José Maria Quadros de Alencar, como cidadão de expressar suas idéias.
Ao fazê-lo o cidadão José de Alencar cativa a nossa admiração ao revelar um profundo eruditismo nas coisas do direito trabalhista em linguagem clara, compreensível.
Humanista de primeira grandeza, é recorrente em seu blog lições belíssimas de sensibilidade e experiência de um homem realizado e de bem consigo. Isso extrapola o alto cargo que ocupa e reverte-se em lições para a reflexão de toda a sociedade.
Continue excelência, paradigmas existem para serem superados.

Anônimo disse...

Caro Francisco,

tivesse razão o anônimo na defesa da isenção asséptica, deveria a Vale suspender sua propaganda em causa própria. Propaganda que induz o povo do Pará e do resto do país a acreditar na sua imagem de empresa responsável socialmente, quando proopagandeia seu financiamento ao Arte Pará, quando coloca plaquinhas no Museu Emilio Goeldi ou quando usa os quilombolas do Mojú na sua propaganda institucional.

Quilombolas que ela descaracterizou inicialmente alegando que eles não existiam como tal. Não lhes reconheceu o direito étnico.

Quilombolas que ela descaracterizou de novo negando-lhes o reconhecimento de proprietários coletivos da terra, ainda que o estado os tivessse reconhecido como tal, e negociou isoladamente indenizações injustas pelas áreas por onde passou o mineroduto e a linha de transmissão.

Ninguém se aborreceu com isso.

Encurtando o papo: o desembargador Alencar manifesta em seu blog suas opiniões. Nenhuma delas, ao que leio, envolve suas decisões ou induz a elas. Inclusive o post que dá origem a este. Para que o anônimo fique em paz, deveria consultar as decisões do desembargador antes de levantar a suspeição que levantou.

Quanto à Vale, induz o povo paraense a engolir suas miçangas enquanto nos arranca a alma. E não a julgamos. Infelizmente.

Um abraço, Francisco.

JOSE MARIA disse...

Meus caros Francisco, Val e Bia.

Muito obrigado pela oportunidade e pela correta defesa.
Para ilustrar - e, quién sabe, lustrar - o anônimo, transcrevo o artigo 36 da Lei Orgânica da Magistratura, pedindo atenção para o inciso III: Art. 36 - É vedado ao magistrado:
I - exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista;
II - exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e sem remuneração;
III - manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério.
Contribuindo mais ainda para essa ilustração, na esperança de que o anônimo daqui por diante possa exercer mais - e melhor seus próprios direitos - transcrevo a cabeça e o inciso V o artigo 5º da nossa vintenária Constituição da República:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
..................................
V - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
Resumindo: eu, ele e nós todos, cidadãos que somos, temos direito à livre manifestação do pensamento. O que é vedado é o anonimato.
Abraços (agradecidos e assinados) do
JOSÉ DE ALENCAR

JOSE MARIA disse...

Por adição, meu caro Francisco, sugiro dar uma passada no sítio de um outro Juiz do Trabalho:http://direitoetrabalho.com/2008/03/o-juiz-so-fala-nos-autos/
Abraços

Francisco Rocha Junior disse...

Caro Dr. Alencar, eu que agradeço pelo certeiro comentário.
Está anotada a sugestão. Vou visitar o blog e, especialmente, a postagem.
Abração.