quinta-feira, 22 de maio de 2008

Maravilha do Ocidente


Reza a lenda que no ano de 708 o bispo Aubert, da pequena cidade de Avranches, na região francesa da Bretanha, recebeu por três vezes em sonho a visita de São Miguel Arcanjo.

Nas três aparições, o anjo instruiu-o a construir, em sua homenagem, uma capela no cimo do monte Tombe (Tumba, em francês), uma ilhota granítica localizada em uma grande área arenosa onde desembocam os rios Sée, Sélune e Couesnon, limites naturais entre a Bretanha e a Normandia.

O local tornou-se rapidamente um destino de peregrinagens, vindo a pequena capela a ser substituída rapidamente por uma abadia carolíngia, ainda durante o século VIII. Passou, pela homenagem ao santo, a chamar-se Mont Saint-Michel.

Com o grande fluxo de peregrinos, uma pequena vila se formou ao pé da abadia. A própria construção original foi-se ampliando, construindo-se-lhe anexos e ampliando-se a obra original. Nos séculos XI e XII, construiu-se uma igreja no cimo do monte. A abadia passou a ser utilizada como cripta, hoje denominada Notre-Dame-Sous-Terre (“Nossa Senhora sob a terra”). Durante os séculos XIII a XVI, outras edificações foram acrescidas ao mosteiro, aumentando sua capacidade de hospedagem e as áreas de administração. Ainda durante este período, o coro da igreja foi reconstruído em estilo gótico, muito mais bonito que o anterior, que desabara.

A flecha da igreja, encimada pela estátua de São Miguel Arcanjo, só veio a ser incluída na construção em 1897. A obra foi feita sob encomenda ao escultor parisiense Emmanuel Frémiet, e aponta ao céu a 157 metros de altura.

A primeira sensação que se tem quando se entra no Monte é, obviamente, de retorno ao passado – como em muitos outros sítios da Europa, aliás. No entanto, esta sensação, ouso dizê-lo, só ocorre com tamanha força, além do Mont Saint-Michel, em Siena, na Itália. Não se trata da pura existência de ruínas; a diferença destes locais para outros tão ou mais antigos está justamente na inexistência de escombros. Parece ao viajante que ele vê a cidade do mesmíssimo modo como ela existia há 500, 600 anos atrás. As construções, em estado esplêndido de conservação, despertam uma sensação respeitosa, senhorial, religiosa até.

À noite, a foule de turistas se vai e ficam na abadia somente os poucos habitantes e alguns visitantes interessados nas sensações noturnas do lugar: silêncio, muito silêncio, tanto quanto estrelas no céu.

O Monte, além de nutrido pelo engenho humano, abraça uma maravilha natural ao seu redor: a rocha está encravada em um imenso areal, uma das marés mais altas do mundo. Um longo campo de areia se estende a perder de vista, a partir do pátio da igreja. A subida da maré é, também, uma das mais rápidas de que se tem notícia: ensina-se aos pequenos franceses, com evidente exagero, que o mar, ali, avança em sua alta à velocidade de um cavalo correndo. Diz-se também que seu entorno costuma engolir os incautos em poças de areia movediça.

Eleito Patrimônio Cultural da Humanidade em 1979 pela UNESCO, o Mont Saint-Michel completa 1.300 anos, neste 2008. São mais de 1.000 anos de uma maravilha permanentemente em construção. Agora mesmo, de seu entorno são retirados os sedimentos que ali se depositaram nos últimos séculos, para que o Monte retome sua característica original de ilha. Cuidados para que os visitantes dos próximos 13 séculos possam reviver a mesma sensação que hoje se tem, ao nele entrar.

No Google Earth: 48°37'58.29"N, 1°30'34.43"W

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