Como emérito noveleiro – aposentado, pois nada do que hoje se faz me agrada –, tenho acompanhado entusiasticamente a reapresentação de Vale Tudo pelo Viva, um dos canais fechados da Rede Globo.
Chama atenção a quantidade de personagens que moram juntos, sem um motivo convencional. Na novela, dividem o mesmo teto os primos Renato (Adriano Reys) e Marco Aurélio (Reginaldo Faria), os amigos e companheiros de trabalho Solange (Lídia Brondi) e Sardinha (Otávio Müller), os sócios Raquel (Regina Duarte) e Aldálio (Pedro Paulo Rangel, que na fase anterior da novela morava com sua irmã Aldeíde, interpretada por Lília Cabral) e os irmãos Jarbas (Stepan Nercessian) e Consuelo (Rosane Gofman). Há um lar multifamiliar, onde coabitam Bartolomeu (Cláudio Corrêa e Castro), sua mulher Eunice (Íris Bruzzi), a filha desta Fernanda (Flávia Monteiro), o neto de Bartolomeu Bruno (Danton Mello), e a mãe deste e ex-nora do dono da casa, Leila (Cássia Kiss). Até mesmo a multimilionária Odete Roitman (Beatriz Segall, no papel de sua vida), apesar de possuir 600 milhões de dólares só em aeronaves e de ter casa em Paris, em Gstaad, na Côte-d’Azur e outros lugares tão votados quanto, quando chega ao Rio de Janeiro mora de favor na casa da irmã Celina (Nathália Timberg) – que já abriga os filhos de Odete, Heleninha (Renata Sorrah) e Afonso (Cássio Gabus Mendes).
Cheguei à conclusão que tanta gente morando junto, sem causa aparente, só poderia ser uma imposição da direção da Globo ao autor Gilberto Braga. Afinal, se hoje são comuns cenas gravadas no exterior, em Vale Tudo as várias viagens da família Roitman a Paris não merecem um mísero postal da Torre Eiffel. O fato certamente não se dá em razão do esnobismo de Odete Roitman, frequentadora dos apartamentos da Avenue Foch e avessa aos souvenirs de viajantes ocasionais, mas do momento histórico que o país vivia; os personagens, que falam o tempo todo em crise econômica, desemprego, falta de perspectivas, dão o tom do período em que a novela se passa.
Vale Tudo, afinal, foi ao ar entre maio de 1988 e janeiro de 1989, nos estertores do governo do faraó maranhense José Sarney. Naquela época, reinava no ministério da Fazenda Maílson da Nóbrega, que ali ficou de janeiro de 1988 a março de 1989, e teve um desempenho de péssima lembrança. Na época, para ficar no índice mais representativo, a inflação fechava cada mês em torno de 80%.
Apesar disso, vejam só: hoje, Maílson vive, dentre outras coisas, de falar mal da política econômica do governo federal e de pretender dar lições de economia aos administradores públicos. Seria engraçado, se todos nós fôssemos ingleses.
2 comentários:
"Vale Tudo" foi uma perola da dramaturgia do Gilberto Braga. Seu post me trouxe muitas boas memorias...
Vale Tudo é show de bola, Raul!
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