Em comentário ao post Violência e a Igreja Católica, Oliver, articulista do Flanar, apresenta uma lúcida e bem fundada contribuição ao debate. Vale a pena a leitura.
Usarei de um jargão de gestão para explicar meu pensamento sobre o assunto, com as escusas necessárias e justificadas pois não sou exatamente um católico, em que pese ter recebido o sacramento batismal.
Penso que a Igreja Católica tem buscado inserir a questão da violência na agenda do catolicismo nacional, mas tem tido inegável insucesso em tornar efetiva local e regionalmente essa agenda.
Por exemplo, quando avaliamos a linha do tempo das Campanhas da Fraternidade observamos claramente a preocupação da CNBB com respeito à questão da violência entre nós. De forma mais ou menos explícita, declarada ou por inferência, podemos identificar a claríssima preocupação com a violência em suas diferentes expressões sociais:
1983 - Tema: Fraternidade e Violência/ Lema: Fraternidade sim, violência não
1984 - Tema: Fraternidade e Vida/ Lema: Para que todos tenham Vida
1985 - Tema: Fraternidade e fome/ Lema: Pão para quem tem fome
1986 - Tema: Fraternidade e Terra/Lema:Terra de Deus, terra de irmãos
1987 - Tema: Fraternidade e o menor/ Lema: Quem acolhe o menor, a Mim acolhe
1990 - Tema: Fraternidade e a Mulher/ Lema: Mulher e homem a imagem de Deus
1996 - Tema:A Fraternidade e os Encarcerados/ Lema: Cristo liberta de todas as prisões.
2001 - Tema e lema: Vida sim, drogas não!
2008 - Tema: Fraternidade e defesa da vida/ Lema: Escolhe, pois a vida.
2009 - Tema: Fraternidade e Segurança Pública/ Lema: A paz é fruto da justiça.
Então o que falta em 25 anos de Campanha de Fraternidade, para que a mais antiga instituição religiosa do país, que se confunde com o próprio achamento dele, possa imprimir uma presença mais efetiva no combate a violência no país, considerando os marcos lógicos estabelecidos claramente nos concílios da CNBB?
Três hipóteses combinadas: o progressivo combate a partir dos anos 80, intra-institucional contra o grupo de religiosos adeptos da Teologia da Libertação (os padres-melancias, como pejorativamente os chamava o colunista Ibrahim Sued: verdes por fora, vermelhos por dentro), pregadores de um socialismo cristão à esquerda, num momento em que o Mundo experimentava as primeiras modificações do eixo do poder global, de que é símbolo o desmoronamento do bloco socialista europeu e soviético, a glasnost , a democratização da Polônia e a eleição de Carol Wojtila, o extraordninário Papa João Paulo II, para conduzir o realinhamento da Igreja Católica Romana e, last but not least, sua sucessão pelo Cardeal Ratzinguer, religioso claramente identificado com o pensamento mais ortodoxo do catolicismo romano.
Essas questões externas foram para o padroado nacional avassaladoras, se consideramos que estiveram associadas à progressiva e constante precariedade da formação religiosa dos religiosos católicos no país – quanti e qualitativamente -, assim como a um cenário político nacional de progressiva permissividade com a solução de nossos problemas sociais, fato claramente agravado pela onda neoliberal que chegou a nossas praias em um verão que não foi exatamente aquele do Gabeira.
A dicotomia horizontal e vertical entre pensadores estratégicos (Bispos) e pensadores operacionais (Cônegos,Padres,Freiras, Diáconos,etc) quando acirrada a esse ponto, em termos de planejamento estratégico, fazem o projeto se enfraquecer tremendamente no mundo real, tornando-se - com o perdão da palavra, na falta de outra - em caricatura de si próprio. Há, portanto, claramente indícios de que os pactos devem ser revistos, sob risco de perder-se o protagonismo que o rebanho exige de um pastor atencioso.
A análise é pertinente: a iniciativa deixa de ser o problema, já que, efetivamente, as Campanhas da Fraternidade têm reiterado o apelo ao combate à violência; mas, como Oliver bem destacou, a política da Igreja nos países emergentes, principalmente após o realinhamento da instituição com seu viés mais conservador, é de não-interferência nos assuntos de ordem mundana, por assim dizer.
Mas o discurso da Igreja Católica Apostólica Romana continua sendo o da preocupação social. Esta, inclusive, reitero, é corolário da mensagem primeva do Cristianismo. O projeto de atuação não pode ser impedido pela falta de aproximação entre os chamados pensadores estratégicos e os pensadores operacionais.
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