quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

DNA brasileiro

Grande sucesso da Ford, o EcoSport deixou de ser SUVzinho de mocinha, cresceu e virou carro. A nova versão do veículo  primeira grande reformulação, pois mudou a plataforma; todas as mudanças anteriores foram meros face lifts — foi apresentada hoje, na Índia, no Salão de Nova Délhi. Veja só o que começará a ser vendido no país em meados deste ano:

Cara de mau, porte robusto. Agora é carro de homem.

Traseira com ares de Hyundai. Dá vontade de ter um.

A presente postagem não se limita a simples entusiasmo de um fã de carros. Por incrível que pareça, este acontecimento sinaliza mudanças relevantes na economia mundial. Pense bem: Salão do Automóvel de Nova Délhi? Alguns anos atrás, isso seria impensável. Mas agora os países emergentes não são mais meros mercados do refugo da indústria automobilística. A indústria depende deles, já que os países ricos estão há anos numa crise que não dá sinais de arrefecimento. Consequência: os emergentes agora querem carros mais recheados de tecnologia, mais modernos e bonitos, econômicos e com preço justo.
O outro sintoma é que, pela primeira vez na história da Ford, uma empresa americana, será vendido no mundo (o tal conceito de carro global) um veículo desenvolvido pela engenharia brasileira. Yes, we can. E os brasileiros fizeram bonito, porque o resultado enche os olhos e faz o pé direito coçar.
Robusto, ele até impressiona. Mas sem os enfeites,
lembra os carros da Lada, aquela russa que passou
por aqui nos anos 1990. Ou seja...
Curiosamente, o anúncio de hoje trará efeitos colaterais para a própria Ford, que há tempos vem amargando quedas nas vendas do EcoSport. Ele reinou absoluto num mercado sem concorrentes por certo tempo, mas depois teve que brigar com importados que ofereciam mais por mais ou menos o mesmo preço. No segundo semestre do ano passado, a Renault quase nocauteou a Ford, ao lançar o Duster, agora um concorrente direto, de fabricação nacional, maior, mais robusto, mais vistoso e com preço competitivo, apesar de uma desconcertante pobreza no acabamento. Em apenas 15 dias, o Duster humilhou o EcoSport, num desempenho de vendas que se mantém. Agora que estamos prestes a receber a nova versão, as vendas do Ford devem despencar. Todo mundo preferirá a novidade, exceto aqueles que farão a festa com as promoções que a empresa será forçada a fazer.
Quando o novo EcoSport chegar, terá condições de dar uma chega pra lá no Renault, que tem seus méritos, mas incomoda com aquele design do leste europeu — o projeto é da Dacia, subsidiária romena da Renault, responsável pelo Logan, um dos carros mais feios já vendidos no Brasil. Seu visual algo coreano é magnífico, mas precisa oferecer mais do que isso: preço, consumo de combustível e melhorias no acabamento pobrinho, que sempre comprometeu o Eco.
Seja como for, a dobradinha governo (por causa dos impostos) e empresariado (por causa da ganância) farão o EcoSport custar muito mais do que poderia. Essa é uma realidade que ainda nos constrangerá por muito tempo. Quem sabe até aprendermos a ser eleitores e consumidores conscientes.
Que tal apoiarmos a ideia de boicote a carros caros?

4 comentários:

Scylla Lage Neto disse...

Yúdice, não consigo comungar do seu entusiasmo pela origem "genética" do novo Ecosport.
Há 20 anos sonhávamos com o padrão europeu e/ou americano de qualidade, com o fim das "carroças" e com o total alinhamento de lançamentos com o primeiro mundo.
O que temos hoje?
A Chevrolet com um festival de carros velhos, tentando se equiparar ao padrão chinês de design e de qualidade. Seus melhores produtos são oriundos do México.
A FIAT, campeã de vendas, re-estilizando a velharia automotiva de 20 anos atrás e trazendo projetos direcionados ao terceiro mundo (Linea), ou fracassos comerciais da Europa, como o Brava.
A Volkswagen colocando quase todos os carros no chassis do Fox, e importando do México o resto.
A Ford também produz o ultrapassado aqui, importando dos "hermanos" o seu creme.
Pelos padrões atuais de segurança, os carros comuns devem ter itens como controle de estabilidade, controle de tração, motores pouco poluentes e econômicos, além dos clássicos ABS e airbag.
Pegue um Golf alemão comum, por exemplo, e ele terá tudo isso, por um custo justo (lá, é claro).
Vejo que assumimos que a nossa praia é a mesma da China, Índia, Tailândia e do leste europeu, mercados pouco exigentes, de mão-de-obra barata e com muita possibilidade de lucro.
Lamento, mas é assim que nos vejo no mercado automotivo.
E concordo totalmente que deveríamos parar de comprar carros caros e também os baratos, como um movimento pelo preço e qualidade justos.
Que tal uma campanha tipo "uma semana sem comprar no carro", no país inteiro?
Um abraço.

Francisco Rocha Junior disse...

Por essa breve, mas incisiva, manifestação do Scylla é que eu digo: um viva aos carros coreanos.

Pedro do Fusca disse...

Caro Scylla, complementando o seu belo comentário sobre estes "carrões" o item destes carros com respeito a segurança são reprovados em todos os testes e ninguem toma uma providencia para que isto não aconteça. É a nossa classe politica mamando nas montadoras!

Yúdice Andrade disse...

Meus caros, não julgo que eu estivesse entusiasmado na hora em que escrevi o texto. Minha intenção foi dizer que, quem sabe a partir de agora, finalmente a indústria automobilística terá que melhorar seus produtos voltados para os mercados emergentes. Nesse caso, Scylla, talvez acabe essa distinção entre os mercados e fiquem apenas os projetos globais. O carro que eu comprasse aqui teria o mesmo projeto (quiçá os mesmos acessórios) do mesmo modelo comprado nos Estados Unidos, no Japão ou na Europa.
Quem sabe?
Com efeito, o cenário descrito pelo Scylla é a nossa realidade e por isso mesmo a crítica. É simplesmente ridículo que lancem por aqui, como novidade, um carro que é vendido na Europa há 2, 3 anos. Às vezes, até deixou de ser produzido por lá. Isso é refugo.
Em suma, especulo se a economia mundial não forçará a indústria a homogeneizar seus produtos (quanto possível). E aí comprará o carro quem puder, de acordo com seu bolso e com a ganância do governo de seu país. Mas é só uma especulação, mesmo.
Abraços em todos.

PS - Queria muito um coreano desses em minha vida, Francisco.