O outro blog do nosso confrade Yúdice Andrade noticia o advento das primeiras reclamações constitucionais aforadas contra o uso de algemas, fundamentadas na suposta violação à Súmula Vinculante n. 11, expedida pelo Supremo Tribunal Federal em agosto deste ano.
As reclamações foram ajuizadas por advogados de presos que compareciam a audiências. Entre eles, nenhum banqueiro, político ou doleiro; os algemados eram um corretor, dois catadores de papel e um servente de pedreiro.
A respeito do tema, o procurador de Justiça do Rio de Janeiro Kléber Couto publicou artigo no jornal O Globo de ontem. Pertinentemente, Couto discute a motivação do STF para a expedição da Súmula Vinculante n. 11. Apesar de adotada após um julgamento que nada tinha a ver com Daniel Dantas, é relevante pensar que a operação Satiagraha foi a grande causadora da atuação sumular do Supremo.
Súmula não é lei
A proibição do uso de algemas pelo Supremo Tribunal Federal por meio de uma súmula merece uma abordagem mais reflexiva. O STF não proíbe nada, até mesmo porque não lhe cabe fazê-lo. Ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei, e súmula não é lei.
A súmula não tem o peso e a importância que lhe quer dar o STF, em sua postura invasiva e pouco democrática. É mera declaração de um entendimento sobre uma controvérsia jurídica, e não há qualquer divergência nos tribunais que justifique sua expedição. Há, sim, uma polêmica anulação de um julgamento de um acusado por ter sido algemado em plenário do júri. A sua condição de pedreiro, sabemos, não será inútil ao STF nos futuros julgamentos de banqueiros.
Por essa visão técnica a referida súmula caracteriza-se como flagrante lesão constitucional.
Não se discute que o aspecto nocivo das prisões da PF está em transformá-las em humilhante espetáculo.
Mas, quando um policial vende ou vaza informes sobre a prisão a ser efetuada está em flagrante abuso de sua atividade. A vítima do abuso, com ou sem algemas, sempre teve meios próprios para buscar o ressarcimento de suas lesões, e a lei também já prevê as punições necessárias. Ou seja, não precisava o Judiciário indicar o que já foi claramente dito pelo Legislativo.
A questão de fundo é saber por que a súmula foi expedida. O STF não a expediu em seu conceito jurídico.
Na verdade, o seu presidente bradou com raiva e arrogância uma ameaça a todos pela segunda prisão do banqueiro Daniel Dantas.
O desejo de buscar a severa punição para o magistrado que a determinou só não foi adiante em razão da corajosa resistência da magistratura e do MP de todo o país. Mudou a estratégia. Preferiu exigir a queda da cúpula da Abin (Agência Brasileira de Inteligência).
A natureza política dessa súmula que revela a delicadeza do momento político do STF faz surgir a indagação: como e quando surgem no processo de privatização das teles Daniel Dantas e o ministro Gilmar Mendes, à época advogado-geral da União no governo Fernando Henrique? Vale uma reflexão à parte.
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